Geral Educação

Pais pedem liberdade de expressão para alunos e professores de escola com gestão militar no DF

Por Redação

02/12/2021 às 19:18:27 - Atualizado há
Cartazes em comemoração ao Dia da Consciência Negra não agradaram PM, que faz gestão do CED-01, na Estrutural. Além de homenagear personalidades, material criticava violência policial contra negros. Mural feito por alunos do CED 01 da Estrutural, para o Dia da Consciência Negra

Arquivo Pessoal

Uma escola pública do Distrito Federal virou palco de polêmica, nas últimas semanas, quando alunos do 8º e do 9º ano, além de estudantes do Ensino Médio, fizeram cartazes para celebrar o Dia da Consciência Negra. O material não agradou a Polícia Militar, que faz a gestão do CED 01, na Estrutural.

No painel, além de homenagear personalidades, os estudantes usaram desenhos, textos e charges que falam sobre racismo e discriminação. Alguns deles traziam críticas à violência policial contra a comunidade negra.

Nesta quinta-feira (2), os pais dos estudantes se reuniram para pedir liberdade de expressão na escola militarizada. Também participaram do ato, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), do Movimento Negro, da União Brasileira de Estudantes e deputados da Câmara Legislativa do DF (saiba mais abaixo).

Grafite de Nelson Mandela feito em 2018, no CED 1 da Estrutural, que foi apagado pela PM em 2019

Ana Elisa Santana/Arquivo pessoal

A mesma escola já havia chamado a atenção quando, em 2019, os militares apagaram um grafite com o rosto do ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela – ícone da luta pela igualdade racial – que havia sido pintado em um muro, antes da gestão da PM (veja imagem acima). À época, a direção do Centro Educacional 1 decidiu refazer a imagem.

Desta vez, no dia 22 de novembro passado, o diretor disciplinar da escola, tenente Araújo, teria pedido para que os murais sobre o Dia da Consciência Negra fossem retirados. "Eu respondi que não ia tirar, que a escola não vai censurar o trabalho de alunos", conta a vice-diretora.

A PM afirma que não houve o pedido para a retirada dos cartazes do mural. "Houve sim, uma consultoria junto a direção da escola sobre o tema abordado, uma vez que não condiz com a realidade e a decisão ter sido tomada de maneira unilateral, sem qualquer diálogo com a coordenação disciplinar que faz parte da gestão compartilhada da escola", diz a corporação.

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Charge de mural feito por alunos do CED 01 da Estrutural, para o Dia da Consciência Negra

TV Globo/Reprodução

Ensino militarizado

A unidade de ensino público é um dos colégios de Brasília que funcionam com o modelo compartilhado de ensino militarizado. De acordo com a vice-diretora, Luciana Pain, dentro do regimento das escolas cívico-militares, há incisos que "são bem claros" quanto a autonomia didático-pedagógica.

"Não pode existir essa interferência", diz a vice-diretora da escola.

"Quando o tenente me procurou, eu falei para ele usar isso como uma oportunidade para conversar com os alunos, juntá-los na quadra, debater o tema. Ele disse que iria remeter a questão aos superiores dele", conta Luciana Pain.

Mural feito por alunos do CED 01 da Estrutural, para o Dia da Consciência Negra

Arquivo pessoal

Os cartazes não chegaram a ser retirados, mas o caso acabou parando na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). A comissão denunciou a suposta censura à Secretaria de Segurança Pública, à corregedoria da PM, à Secretaria de Educação, ao comitê de ética da Câmara Federal e ao Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do Ministério Público (MPDFT).

Em nota, a Secretaria de Educação disse que "considera preocupante o fato de um estudante ter a imagem das Forças de Segurança associada ao racismo ou ao nazismo e acha importante que o tema seja debatido durante o processo pedagógico".

Protesto por liberdade de expressão

Escola militarizada na Estrutural recebe manifestação em favor da liberdade de expressão

Nesta quinta (2), a quadra esportiva da escola foi palco para a manifestação em defesa dos alunos e dos professores, e em favor da liberdade de expressão na escola. De acordo com o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da CLDF, deputado Fábio Félix (Psol), é "absurdo e ilegal", que policias interfiram na parte pedagógica da escola.

"A liberdade de cátedra é uma garantia constitucional", diz o deputado distrital.

Para o presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB-DF, Beethoven Andrade, os cartazes expressam a forma como os alunos percebem a realidade – dentro e fora dos muros da escola. "Eles mostraram o que, de fato, acontece ao lado da casa deles, o que acontece com os irmãos, com os pais, e até mesmo com eles. Então, essa é uma verdade que a gente tem que começar a compreender e tentar mudar esse cenário", diz o advogado.

"Não é porque uma criança fala que o seu familiar, que a sua comunidade sofre uma violência policial, que ela está errada. Simplesmente ela está mostrando uma realidade, e nós devemos reconhecer isso", diz o representante da OA, Beethoven Andrade.

Como funcionam as escolas militarizadas no DF

O Distrito Federal tem, atualmente, dez escolas com gestão cívico-militar. Nelas, o modelo de ensino é semelhante ao das escolas militares no que diz respeito à disciplina. Policiais e bombeiros integram o quadro de servidores.

Segundo o GDF, as regiões escolhidas para o projeto foram baseadas em quatro critérios:

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), principal indicador sobre a qualidade do ensino no Brasil

IDH, índice medido anualmente que tem como base indicadores de saúde, educação e renda

Mapa da violência do local

Estrutura das escolas

Os estudantes devem usar uniforme. Os meninos precisam ter cabelos curtos e as meninas prender o cabelo em um coque.

No contraturno do ensino regular, os policiais podem dar aulas de musicalização, ética e cidadania, por exemplo.

Em 2019, a implementação da proposta, feita pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), gerou críticas, principalmente do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro).

O modelo é defendido pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) "para melhorar a qualidade do ensino público". A adesão das unidades da federação é voluntária.

Quando anunciado, em 2019, o programa previa 200 escolas do tipo até 2023. Em 2020, mais de 50 aderiram ao projeto piloto. A previsão era de que cada escola recebesse R$ 1 milhão para implementar o projeto, de acordo com o Ministério da Educação.

VÍDEO: PM intervém em briga de escola militarizada no DF

Vídeo mostra policial militar derrubando aluno de escola pública em Ceilândia, no DF

Leia mais notícias sobre a região no g1 DF.
Fonte: G1
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