Secretário admite que o ano eleitoral é um obstáculo à discussão da agenda da reforma tributária, mas espera que a sinalização da entidade sirva de incentivo ao Legislativo para retomar a pauta Os desafios ambientais e tributários serão os temas mais complexos a serem encaminhados pelo Brasil em seu processo de adesão à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), afirma o secretário-executivo do Ministério da Economia, Marcelo Guaranys, em entrevista à reportagem.
Para ele, a decisão da entidade de iniciar formalmente as negociações com o Brasil é um momento histórico, mas ainda há um longo caminho a ser percorrido.
O governo brasileiro entra agora na fase de mapear o que falta ser feito para atender aos 148 dos 251 instrumentos de boas práticas da OCDE que ainda não foram completamente atingidos. A partir desse levantamento, o país traça uma estratégia de ação.
"Sempre a parte tributária e financeira é mais complexa. Nosso sistema tributário é complexo, por isso a gente precisa fazer uma reforma tributária. Esse é o mais complexo do ponto de vista de trabalho", diz Guaranys.
A reforma tributária é tratada como pauta prioritária pela equipe econômica do governo Jair Bolsonaro (PL), que já encaminhou ao Congresso propostas para simplificar dois dos principais tributos sobre consumo (PIS/Cofins) e para rever o Imposto de Renda.
A reforma do IR, que previa a retomada da taxação de dividendos (prática adotada em praticamente todos os países membros da OCDE), chegou a ser aprovada na Câmara, mas travou no Senado Federal.
Já o projeto sobre PIS/Cofins esbarrou na falta de consenso em torno do texto. O Senado ainda mantém discussões em torno de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que unifica os tributos sobre consumo, inclusive estaduais e municipais.
O secretário admite que o ano eleitoral é um obstáculo à discussão dessa agenda. Por outro lado, ele espera que a sinalização da entidade sirva de incentivo ao Legislativo para retomar a pauta.
"Temos que continuar avançando independentemente dos próximos meses. Sabemos que é um ano mais difícil, em que as atenções começam a se voltar para todo o processo de eleição, mas a gente não pode deixar o país parado por isso", afirma.
"Essa sinalização da OCDE mostrando que o trabalho foi bem feito até agora é muito importante para nos dar força para isso. Congressistas, entendam como é importante para a gente, para o processo de adesão. Então, vamos ajudar a fazer a gente avançar", acrescenta.
Outro tema complexo, segundo o secretário, é o ambiental. O Brasil tem sido criticado pela comunidade internacional pelo aumento no desmatamento e nas queimadas em biomas como a Amazônia.
A OCDE incluiu nos documentos que formalizam o início das negociações com o Brasil obrigações de redução de desmatamento e medidas de mitigação de mudanças climáticas previstas no acordo de Paris.
Na carta-convite aos países e no comunicado, obtidos pela reportagem, os membros do conselho da OCDE enfatizam que deve ser considerado o comprometimento dos países com metas de redução de desmatamento e perda de biodiversidade na avaliação para autorizar a entrada na entidade.
"O que a gente tem sofrido mais críticas são questões de desmatamento. Temos muitas florestas, e esses indicadores de desmatamento ilegal precisam ser reduzidos. E é nisso que a gente tem trabalhado dentro de cada área", afirma Guaranys, acrescentando que o órgão mais indicado para tratar de políticas sobre o tema é o Ministério do Meio Ambiente.
"Nos comitês específicos dos instrumentos ambientais, a gente vai ter um trabalho grande de convencimento, mas acho que a gente tem dados para poder mostrar para a comunidade internacional, e aí é um trabalho de comunicação e aprimoramento", acrescenta o secretário.
A ideia do governo brasileiro é destacar pontos positivos, como uma maior participação de fontes renováveis na matriz energética (como hidrelétricas, usinas eólicas e solares) do que em outros países, além de iniciativas para impulsionar investimentos com selo verde.
Uma delas, citada pelo número dois da Economia, é a CPR (Cédula de Produto Rural) Verde, título que permite ao investidor privado remunerar o produtor pela preservação ambiental da propriedade segundo critérios firmados entre eles.
O instrumento foi lançado em outubro do ano passado, às vésperas da COP26 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021).
O próprio ministério, porém, elenca como "ponto de atenção" a necessidade de avançar na direção de instrumentos mais eficazes de avaliação e mitigação de impactos ambientais, bem como na redução de subsídios a atividades que prejudiquem o meio ambiente.
Segundo Guaranys, o ingresso do Brasil na OCDE tende a ampliar a confiança no país e alavancar investimentos. "A gente passa a ter acesso a mais crédito e investimentos de fundos", afirma.
Ele diz que há grandes fundos de investimento que são obrigados, pelo estatuto, a direcionar até 90% dos seus recursos a países da OCDE. "Quando a gente adere, passa a ter acesso a um mundo completamente diferente."
A expectativa da equipe econômica é que a adesão à entidade seja um fator de aceleração da retomada do grau de investimento - uma espécie de selo de bom pagador, que o país perdeu em 2015 na esteira da piora nas contas públicas e da perda de credibilidade em regras fiscais.
"Passando por esse processo, a gente vai com certeza melhorando a credibilidade da nossa economia e vai avançando na busca do grau de investimento", afirma.
Segundo Guaranys, a experiência de outros países mostra que o processo de adesão demora de dois a cinco anos, mas a expectativa do Brasil é concluir o mais rápido possível.
Joga a favor do Brasil o fato de que o país já aderiu a 103 dos 251 instrumentos, após um trabalho de intensificação dessa convergência enquanto ainda se esperava por uma resposta ao pedido de adesão, protocolado há mais de quatro anos.
Outros cinco países foram convidados a ingressar na OCDE nesta terça-feira (25). Desses, o que tem o maior número de adesões a instrumentos depois do Brasil é a Romênia, com 53. Os demais convidados foram Argentina, Peru, Bulgária e Croácia.
"A gente já andou muitos passos, os outros países estão muito longe disso", diz o secretário.
"Entrar na OCDE faz com que a gente passe por um processo de revisão da nossa legislação, para que esteja aderente com as melhores práticas dos países desenvolvidos. É isso que a gente quer", acrescenta.