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USP exige 750 pontos em matemática no Enem e afasta cotistas do Sisu: 'Fora da realidade', diz candidata negra

Por Redação

17/02/2022 às 17:57:55 - Atualizado há
Ao menos sete cursos de engenharia da Escola Politécnica com esse requisito tinham, até a meia-noite de quarta-feira (16), menos inscritos do que vagas disponíveis. Cotas abrangem autodeclarados pretos, pardos e indígenas que estudaram na rede pública durante o ensino médio. Amanda Catarino foi aprovada na USP pela Fuvest. Via Sisu, ela não conseguiria sequer se inscrever, já que não alcançou os 750 pontos exigidos na prova de matemática do Enem.

Arquivo pessoal

Até a meia-noite desta quarta-feira (16), nenhum candidato que estudou em escola pública e que se autodeclara preto, pardo ou indígena havia se inscrito para o curso de engenharia de petróleo da Universidade de São Paulo (USP), pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu). O prazo de inscrições termina nesta sexta (18).

Em ao menos outras seis graduações da Escola Politécnica da USP, como engenharia civil ou ambiental, a modalidade de cotas para o grupo descrito acima não tinha sequer nota de corte parcial. "A quantidade de inscritos é inferior à de vagas", afirma o site.

Sistema do Sisu informa que não houve número suficiente de inscritos até o momento para o curso de engenharia de petróleo

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São justamente cursos que aceitam apenas candidatos (cotistas ou de ampla concorrência) que tiraram, no mínimo, 750 pontos na prova de matemática do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2021. A regra é definida por cada faculdade (o Instituto de Psicologia, por exemplo, exige 400 pontos em todas as disciplinas).

Curso de engenharia de petróleo exige 750 pontos na prova de matemática do Enem

Reprodução

"Essas notas [da Politécnica] são muito fora da realidade das pessoas negras de escola pública. Elas não tiveram acesso a uma educação de qualidade", diz Amanda Carla Catarino, de 20 anos.

Ex-aluna de escola estadual e de cursinho popular, a jovem foi aprovada neste ano em engenharia mecânica na USP, por meio de cotas no vestibular da universidade (Fuvest). Pelo Sisu, ela não teria conseguido sequer se inscrever no curso.

"Tirei 670 em matemática no Enem, então, já ficaria de fora", afirma.

"E eu ainda sou exceção, porque pude me dedicar só aos estudos e recebi ajuda do meu padrinho, que é professor. Mas a maioria dos meus colegas não teve as mesmas condições. Não é à toa que é tão difícil encontrar pessoas negras que sejam referência em exatas aqui no Brasil. Ainda são muitos obstáculos."

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Defasagem de conhecimento x exigências do curso

Os cursos de engenharia da Escola Politécnica da USP exigem, segundo estudantes ouvidos pelo g1, conhecimentos avançados em matemática desde o início do 1º semestre.

"A nota mínima [de 750 pontos no Enem] é colocada no Sisu para que ninguém seja aprovado sem saber o básico da disciplina. O problema é que isso se torna uma barreira para o ingresso dos alunos de escolas públicas, que recebem uma educação deficitária", afirma Lucas Ventura, de 21 anos, aluno de engenharia da computação na USP e membro do coletivo Poli Negra.

Lucas é aluno de engenharia da computação na USP e membro do coletivo Poli Negra

Arquivo pessoal

De acordo com ele, seria preciso investir em cursos introdutórios de cálculo, por exemplo, para que todos os ingressantes tivessem condição de acompanhar as aulas.

"Esse tipo de iniciativa tem partido mais dos próprios alunos [veteranos] e de grêmios ou centros acadêmicos. Há pouco esforço institucional", complementa.

Em nota, a assessoria de imprensa da faculdade afirma que a Comissão de Graduação instituiu, no início de 2020, o programa "Estou na Poli", com videoaulas para os calouros. "Os alunos [mais avançados] entram como tutores voluntários e são orientados pelos responsáveis [da USP]", afirma a universidade.

O g1 perguntou à instituição se a definição das notas mínimas no Enem acabaria prejudicando alunos egressos da rede pública. Não houve resposta até a última atualização desta reportagem.

Alunos negros na USP

A USP aderiu às cotas no Sisu em 2016. O reflexo disso no perfil discente já é perceptível: entre 2010 e 2019, a universidade quadruplicou o número de estudantes de graduação que se declaram pretos, pardos ou indígenas.

"Quando eu frequentava a USP em feiras de ciências, aos 10 anos, só via pessoas brancas. Parecia algo fora da realidade. Antes, eu olhava e pensava: não é um lugar para mim", diz Amanda, mencionada no início desta reportagem.

"Houve um avanço. Mas, em exatas, essas notas mínimas dificultam nosso acesso. Eu, por exemplo, sempre fui uma boa aluna na escola e ainda fiz um curso técnico em automação. Ainda assim, por menos de 100 pontos, eu não poderia me inscrever em engenharia no Sisu", afirma.

"Se não tem nem nota de corte para os cotistas, é um sinal claro de que a universidade precisa baixar essa exigência. A cota vai servir para quê, se ninguém se inscrever?", questiona.

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Fonte: G1
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