Entidade justifica necessidade de se adequar à Lei Geral de Proteção de Dados. Omissão dos dados pode impactar no levantamento de parâmetros importantes para a avaliação educacional, diz economista. Inep divulga microdados do Enem 2020.
Igor do Vale/g1
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou na última sexta-feira (18) os microdados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020.
Os dados foram divulgados em um novo modelo que não descreve o código de identificação da escola, os municípios de nascimento e de residência do participante e informações sobre os pedidos de atendimento especializado, específico e de recursos para atendimento especializado.
Em publicação, a entidade afirmou que o formato da apresentação do conteúdo foi reestruturado para "suprimir a possibilidade de identificação de pessoas", atendendo aos dispositivos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e da Lei de Acesso à Informação (LAI).
A LGPD é uma lei entrou em vigor em 2020 que rege formas de divulgação de dados para proteger as informações pessoais dos cidadãos. Já a LAI, em atividade há 10 anos, determina os processos de transparência dos órgãos públicos, e determina, entre outras regras, a divulgação ativa de dados sobre programas e políticas públicas.
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Para a economista Fabiana de Felício, diretora da consultoria Metas Sociais, a omissão destes dados pode impactar no levantamento de parâmetros importantes para a avaliação educacional. Um estudo sobre a desigualdade de acesso à escolas de qualidade por raça/cor, por exemplo, fica impossibilitado.
Para ela, que atuou como diretora de Estudos Educacionais do próprio Inep entre 2005 e 2008, quem se prejudica com a falta destes dados é a população.
"O público principal dos microdados do Enem são pesquisadores, que querem entender como está a infraestrutura das escolas, o desempenho dos alunos de áreas rurais, por exemplo. O resultado disso pode vir em investimentos na educação ou em cobranças por parte da sociedade civil. Sem estes dados, o pesquisador pode mudar de área e ninguém vai saber como está o panorama da educação".
Para Ernesto Martins Faria, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), a decisão do Inep não se justifica.
Segundo o especialista, as mudanças aplicadas não são as necessárias para adequar os microdados à LGPD. "Tem ajustes que deveriam ser feitos para dificultar a identificação dos alunos. Mas poderiam ter adotado estratégias para dificultar essa identificação. Por exemplo: tirar a data de nascimento e colocar só a idade em diferentes datas de referência". sugere.
Faria opina que ocultar o código da escola e o município dos participantes é um extremo, que se compara a retroceder a um momento pré-microdados.
Importância dos dados
Fabiana de Felício explica que não é a população que cruza os dados dos estudantes, mas que este é um passo importante para pesquisadores da área da educação. Isso porque identificar o participante do levantamento permitiria ao profissional acompanhar o desenvolvimento do aluno ao longo de sua vida acadêmica, por exemplo.
"Os dados são de interesse do pesquisador. O profissional precisa saber se aquele aluno que prestou o Enem chegou ao ensino superior, se prestou o Enade. As informações são cruzadas apenas para fins como este", explica ela.
Segundo o Inep, pesquisadores ainda poderão ter acesso aos dados através do Serviço de Acesso a Dados Protegidos (Sedap), que possibilita solicitar acesso a bases restritas da entidade.
Para Felício, a decisão não supre a necessidade, já que o sistema é burocrático e pode negar ao profissional acesso a dados importantes.
Readequação de edições anteriores
O Inep retirou do ar os microdados de todas as edições do Enem, desde 2009, e do censo da educação básica dos anos anteriores, sob a justificativa de que vai readequar o material ao novo modelo. A entidade não informou quando as novas versões serão disponibilizadas no site.