Desde o último fim de semana, delegações de indígenas representando 120 povos de todas as regiões do país começaram a chegar em Brasília para se reunir no Acampamento Terra Livre (ATL), evento anual que ocorre em abril, conhecido como o mês indígena, e está em sua 18ª edição.
Segundo os organizadores do ATL, estima-se que já se encontram na capital federal mais de 6 mil indígenas, com expectativa de alcançar 8 mil até a próxima quinta-feira (14), quando se encerra o evento.
Uma das ações desta terça-feira (5) foi o lançamento da Carta Aberta contra o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que aguarda votação no plenário da Câmara dos Deputados. A proposta libera a exploração de territórios indígenas para a mineração e construção de hidrelétricas.
Essa, no entanto, não é a única pauta para a qual os indígenas chamam atenção no ATL deste ano. De acordo com Kerexu Yxapyry, coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas (Apib) e da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), uma das principais lutas dos povos indígenas ainda é pela demarcação de terras.
Uma das ameaças a esse direito é a ação do marco temporal, cujo julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) não foi concluído, devido a um pedido de vista pelo ministro Alexandre de Moraes em setembro do ano passado.
Essa ação sustenta que povos indígenas só podem reivindicar as terras onde já estavam até o dia 5 de outubro 1988, quando entrou em vigor a atual Constituição Federal.
Escolhida como cacica na Terra Indígena Morro dos Cavalos, em Santa Catarina, e reconhecida como representante do povo Guarani pelo movimento indígena, Kerexu teve que aprender sobre a defesa do território para enfrentar os invasores.
“Sofri perseguição, com ameaças de invasão e de morte para a minha família. Dentro do meu município eram promovidas audiências públicas contra os povos indígenas, para nos retirar do nosso território", relata.
“Eu sabia tratar de educação e de direitos, mas não sabia sobre demarcação de terras. Minha indicação para cacica era para defender nosso território, que naquele momento era contestado pelo Estado", recorda Kerexu, que neste ano vai lançar sua candidatura à Câmara dos Deputados pelo PSOL de Santa Catarina.
Acompanhando essa mesma perspectiva, a liderança e coordenadora da juventude indígena de Rondônia, Walelasoetxeige Paiter Bandeira Suruí, da etnia Paiter Suruí, reforça a importância da mobilização do ATL em Brasília.
"O ATL é muito importante para mostrar ao Brasil inteiro a força dos povos indígenas. Mostrar principalmente para essa Câmara dos Deputados, para esse Senado, para esse governo federal que não podem simplesmente querer acabar com os nossos direitos e que vamos ficar calados e quietos", enfatiza a jovem de 25 anos, também conhecida como Txai Suruí.
Ela se destacou em Glasgow, na Escócia, com discurso enérgico em defesa do meio ambiente durante a Conferência das Nações Unidas pelas Mudanças Climáticas, a COP26, em novembro do ano passado.
"Estamos há mais de 500 anos resistindo. A gente está aqui hoje para mostrar que essa resistência não termina agora e que os povos indígenas do Brasil inteiro estão se unindo, numa só voz, num só povo, num só grito para dizer "não" a esse pacote da destruição", completa Txai, que também integra o Parlamento Indígena do Brasil (ParlaÍndio Brasil).
"No nosso 18º Acampamento Terra Livre, trazemos como principal mensagem a demarcação das terras indígenas e aldear a política, porque entendemos que uma das principais ameaças a nós está dentro do Legislativo", frisa Dinamam Tuxá, advogado e coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
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