A morte do jornalista britânico Dom Phillips, confirmada pela família, mas ainda negada pela Polícia Federal, é mais um capítulo da série de agressões contra profissionais da imprensa no Brasil. Phillips morava no Brasil desde 2007 e era conhecido pelo amor à Amazônia e trabalhos que denunciavam crimes ambientais na região e desrespeito aos indígenas.
Desde 2019, conforme levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), os ataques contra jornalistas, no exercício da profissão, cresceram 248%. Há três anos, as estatísticas marcavam 130 casos de agressões a jornalistas no Brasil. Ao final de 2021, o Brasil contabilizou 453 ocorrências, aponta o relatório da Abraji.
A média é de 1,2 casos por dia no país. Segundo a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), 2021 foi, inclusive, o ano mais violento da história para jornalistas que atuam no país. Estudos feitos por ambos os órgãos apontam que os profissionais da imprensa foram vítimas de 140 casos de censura, o que é vedado pela Constituição Federal.
Também foram observados registros de descredibilização da imprensa, ataques verbais e virtuais, ameaças, intimidações, agressões físicas, cerceamentos à liberdade de imprensa por ações judiciais, atentados, assasinato e impedimentos de exercício da atividade.
Em 2021, pelo menos dois profissionais da imprensa foram vítimas de homicídio, aponta a Fenaj. O primeiro caso foi registrado em 4 de abril, quando o radialista Weverton Rabelo Fróes, de 32 anos, foi morto a tiros em frente à casa onde morava em Planaltino, no Sudoeste da Bahia.
O autor do crime não foi identificado. O radialista já havia reportado, antes do assassinato, que estava recebendo ameaças de fechamento da Rádio Antena 1. em que trabalhava. O outro caso que terminou em morte foi do jornalista Eranildo Ribeiro da Cruz, de 54 anos. Morador de Almeirim, no Pará, ele foi encontrado em casa amarrado, nu, e com sinais de tortura e um ferimento na cabeça.
O repórter, conforme a Fenaj, estava “apurando possíveis fraudes na eleição municipal e também denunciou a morte de um bebê por suposta negligência da Prefeitura Municipal”. O caso foi classificado pela polícia como latrocínio.
No entanto, "o homem que foi preso e confessou que matou o jornalista para roubar, apontou mais um envolvido no homicídio, que pode ter tido outro motivo para o crime”, assinala a Fenaj.
Conforme a Federação, o presidente Jair Bolsonaro (PL), desde que assumiu a Presidência, em 2019, tornou-se o principal autor de ataques a veículos de comunicação e jornalistas. "Em 2021, repetindo a mesma posição ocupada nos dois anos anteriores, ele foi o responsável direto por 147 ocorrências (34,19% do total), a maioria delas, tentativas de descredibilização da imprensa (129), mas também por 18 casos de agressões verbais diretas aos jornalistas", afirma.
A Fenaj ainda atesta que outros 40 ataques contra os profissionais da imprensa vieram de políticos ou de assessores de gabinete. Neste caso, estão relacionadas agressões físicas e verbais, ataques virtuais e ameaças.
“O Jornalismo é um dos pilares das sociedades democráticas e não há Jornalismo sem jornalistas. Portanto, é responsabilidade de todos combater ações de quem quer que seja, inclusive do presidente da República, para a disseminação de uma cultura da violência contra jornalistas”, disse a presidente da Fenaj, Maria Braga, em relatório publicado sobre violência contra a categoria.
Já para a Abraji, as estatísticas elevadas de agressões aos profissionais da imprensa evidenciam um esforço, que parte de atores estatais, de enfraquecer o trabalho jornalístico no Brasil. A associação cita a disseminação de discursos contra a mídia e a perseguição sistemática a jornalistas.
“Esse movimento pode ter um impacto mais amplo no país, fragilizando também suas bases e instituições democráticas. Este estudo se encerra com uma reflexão sobre as principais tendências observadas no monitoramento e recomendações aos diversos atores envolvidos nesse cenário”, atesta a Abraji.