O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que, apesar de ser contra o aborto, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) respeita as exceções legais que autorizam a interrupção da gravidez em alguns casos, como estupro, risco de vida à mãe e em casos de anencefalia do feto. As declarações foram dadas em audiência na Comissão de Seguridade Social e Família, ao ser questionado por deputadas oposicionistas.
"Quero deixar bem claro, já que vou ser arguido aqui por outros parlamentares: o governo Bolsonaro defende a vida desde a concepção. Isso não é segredo para ninguém. Absolutamente ninguém. O presidente Bolsonaro já anunciou essa plataforma na sua agenda pré-eleitoral. Ele foi eleito com essa agenda: a defesa da vida desde a concepção. Da mãe e do filho. Das duas vidas. Nós somos contra o aborto. Respeitamos as exceções da lei, que é uma lei de 1940. Quais são as exceções? Vossa Excelência sabe: o estupro, a interrupção da gestão em situação de vida da mãe, acrescida dos casos de anencefalia, (o que foi feito) pelo Supremo Tribunal Federal (STF)", disse Marcelo Queiroga.
Ele ainda defendeu que qualquer mudança na legislação deveria se dar com referendo da população.
"Qualquer mudança nesse sentido (do que está na lei), os senhores parlamentares sabem, só pode acontecer com o aval desta Casa. Esta Casa é o local para se decidir a legislação brasileira. Se houver mudança na lei, tem que ser feito por essa Casa. E eu, agora ministro da Saúde, mas como médico e como cidadão, defendo que uma mudança desse tipo, que tem relação direta com a vida, o direito à vida, cláusula pétrea da Constituição Federal, só pode ser decidida com referendo popular", disse ele.
Queiroga respondeu sobre o tema ao ser questionado sobre uma cartilha publicada pela Secretaria de Atenção Primária à Saúde, ligada ao ministério, com orientações sobre o procedimento do aborto. O documento, de 7 de junho, afirma que "todo aborto é um crime" e provocou reação de grupos de pesquisa e entidades de defesa da mulher. Segundo a cartilha, "não existe 'aborto legal' como é costumeiramente citado, inclusive em textos técnicos". Para a Secretaria de Atenção Primária à Saúde do ministério, o que existe "é o aborto com excludente de ilicitude". Em carta à Secretaria de Atenção Primária à Saúde, 78 organizações pediram a revogação do manual. Para as entidades, a cartilha não cumpre a finalidade de apoiar profissionais de saúde nos casos de abortamento e, pelo contrário, impõe "obstáculos à concretização do direito à saúde de mulheres, meninas e pessoas que gestam". Quatro entidades foram ao STF contra a cartilha.
O tema ganhou ainda mais atenção após uma juíza de Santa Catarina negar que uma criança, de 11 anos, vítima de estupro e grávida de 29 semanas, realizasse um aborto autorizado. Em despacho expedido em 1º de junho, a magistrada Joana Ribeiro Zimmer, da 1ª Vara Cível de Tijucas, a 50 quilômetros de Florianópolis, decidiu pela permanência da criança em um abrigo com o objetivo de mantê-la afastada do possível autor da agressão sexual e também para impedir que a mãe da menina, responsável legal pela filha, levasse a cabo a decisão de interromper a gravidez. Depois da repercussão, a menina conseguiu realizar o aborto. A juíza, porém, recebeu apoio de aliados do governo e chegou a ser convidada pelo Ministério da Sáude para participar das discussões da cartilha.
Na audiência pública, o ministro também foi questionado sobre procedimentos obstétricos presentes na cartilha e que não são recomendados pela Organização Mundial da Saúde, como a episiotomia (corte no períneo, região entre o ânus e a vagina, para ampliar o canal na hora do parto). Entidades médicas consideram que a cartilha chancela práticas de violência obstétrica. Marcelo Queiroga disse não reconhecer esse termo e defendeu a autonomia médica na hora do parto.
O TEMPO agora está em Brasília. Acesse a capa especial da capital federal para acompanhar as notícias dos Três Poderes.
O TEMPO