Shoppings em várias regiões do Brasil têm visto uma onda de assaltos em joalherias, alguns em horários de pico e até com troca de tiros entre seguranças e suspeitos. Em São Paulo e no Rio, foram três roubos em menos de uma semana - dois terminaram em mortes. Em maio, houve ao menos dois casos na Grande Belo Horizonte. As polícias ainda tentam entender os perfis das quadrilhas e se há conexão entre os crimes.
Levantamento do Estadão identificou pelo menos 16 ataques a joalherias, desde o início do ano, em seis Estados e no Distrito Federal. Um dos atrativos desse tipo de roubo, apontaram delegados, é o alto valor dos produtos roubados e a possibilidade de usar materiais mais valiosos, como ouro e prata, como fonte rápida de dinheiro.
O caso mais recente foi no Shopping Aricanduva, zona leste da capital paulista. Quatro criminosos assaltaram uma joalheria no local no último dia 29 e, durante a fuga, trocaram tiros com seguranças no estacionamento. Ninguém se feriu, mas o grupo conseguiu fugir e abandonou o carro usado no roubo, que estava cravejado com balas, em uma rua próxima.
À frente das investigações, o delegado Renato Bartelega disse que é o primeiro caso com esse perfil que atende desde que começou a atuar no 66.º Distrito Policial (Vale do Aricanduva), no início do ano passado. Ainda não há presos, mas as investigações estão "bem avançadas", informou o delegado. O prejuízo estimado é de R$ 300 mil.
Menos de uma semana antes, no último dia 25, um grupo fortemente armado invadiu duas joalherias do Shopping Parque D. Pedro, em Campinas, interior de São Paulo. O crime resultou na morte de um suspeito, atingido por um segurança durante troca de tiros no estacionamento, e na prisão em flagrante de outras três pessoas. Parte do bando, que não teve a quantidade de integrantes revelada pela polícia, conseguiu fugir.
"Chamam atenção a ousadia e até a imprudência da quadrilha de ter cometido um crime como esse em um sábado à noite, um dos horários em que os shoppings são mais movimentados", disse o delegado Oswaldo Diez Junior, da Divisão de Investigações Criminais de Campinas. Segundo ele, o tumulto causado não só prejudicou a ação da quadrilha, como colocou consumidores e funcionários do shopping em risco.
Na mesma data, um segurança morreu em uma troca de tiros dentro de um shopping de luxo na zona oeste do Rio de Janeiro. A investigação indica que pelo menos 12 criminosos participaram do assalto à Sara Joias, no Village Mall.
Após recolher joias e relógios, o grupo atirou durante a fuga na cabeça do segurança Jorge Luiz Antunes, de 49 anos, que morreu na hora. Até o momento, dois suspeitos foram identificados. Eles teriam ligação com uma facção no Pará. Procurada pela reportagem, a Polícia Civil do Estado (PCERJ) informou que "as investigações seguem para identificar e prender todos os envolvidos".
Para Diez Junior, os assaltos a joalheria fazem parte de uma migração da criminalidade ainda em curso e que deve ser olhada com atenção. "Com o avanço das transações eletrônicas, viu-se emergir o sequestro relâmpago para tentar desvios por transferência via Pix (ferramenta de pagamento instantâneo)", disse ele, que relatou que as polícias intensificaram o combate a esse tipo de crime. Um exemplo é a Operação Sufoco, em São Paulo.
"Agora a gente está percebendo, em tese, o início dessa migração para os objetos de desejo que são as joias. Elas são de fácil transporte, valor agregado alto e muitas pessoas compram", explicou.
Segundo o delegado, os criminosos costumam vender os objetos em valores bem abaixo do mercado - o que torna a transação atrativa para os receptadores - e ainda assim acabam lucrando bastante com os crimes.
"A preferência das quadrilhas é conseguir dinheiro em espécie com os crimes, mas é difícil hoje em dia, até pela segurança dos bancos e carros-fortes, então fazem isso", disse o delegado. Ele reforça que relógios de luxo costumam ser avaliados em cerca de R$ 100 mil. Ao mesmo tempo, o valor de algumas joias pode superar R$ 1 milhão. "Os shoppings como alvo é porque as grandes joalherias se organizam lá."
"A gente não vê isso como algo específico de shopping, mas como algo do momento do País, da estrutura do País, que a gente está atravessando", afirmou Glauco Humai, presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce). Segundo ele, o avanço da criminalidade diante da retomada econômica acaba resvalando também nos shoppings, onde ganham ainda mais repercussão. "A percepção é que a gente está na mesma média do período pré-pandemia".
"Isso (assaltos) já aconteceu em 2019, 2018... São quadrilhas que se especializam em um ou outro furto (...) Essas quadrilhas, durante algum período, focam em joalheria de shopping, por exemplo, e chamam muita atenção", disse Humai. "A gente está passando por um momento agora, na minha percepção, em que essas quadrilhas estão organizadas, atuando em shopping, mas já rapidamente vão ser desmanteladas." (Estadão Conteúdo)