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BRASIL

UFMG tem déficit de cerca de mil servidores com teto de gastos e cortes de verba


Listada por rankings internacionais como uma das melhores universidades federais do mundo e entre as mais conceituadas do Brasil, a UFMG opera, atualmente, com um déficit aproximado de mil servidores que tiveram os cargos cortados em função de perdas orçamentárias sofridas pela instituição nos últimos anos.

A informação foi repassada à reportagem de O TEMPO com exclusividade pela reitora Sandra Regina Goulart Almeida. Desde 2016, quando o teto de gastos públicos foi implementado no Brasil, o orçamento direcionado para a manutenção do quadro de pessoal praticamente não teve aumento. 

Por outro lado, a verba direcionada aos gastos com manutenção de infraestrutura, custeio de bolsas, financiamento de pesquisas e assistência social sofreu um corte de 45%. No período, a receita despencou de R$ 349 milhões em 2016, para R$ 192 milhões em 2022, conforme a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). “É a situação mais grave que a universidade pública já viveu em toda sua história. Nunca tivemos um contingenciamento tão grave como estamos, porque são cortes em cima de outros cortes. Se não houver uma recomposição do orçamento não vamos conseguir chegar ao fim do ano pagando as contas em dia”, atestou a reitora. 

Se considerada a inflação acumulada no Brasil neste ínterim, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a UFMG deveria estar, atualmente, com um orçamento 38% maior do que há seis anos atrás. Neste caso, os R$ 349 milhões deveriam ter sido corrigidos para R$ 482 milhões. Enquanto isso, a receita para pagamento do corpo técnico, orçado em R$ 1,7 bilhão em 2016 e mantido ainda neste patamar, deveria ser de R$ 2,3 bilhões. O cenário de contingenciamento orçamentário que ameaça o futuro das universidades federais brasileiras já havia sido denunciado por O TEMPO no início da semana.

Investimento em saúde pública

Na UFMG, somente na pandemia da Covid-19, a instituição entregou ao Estado 263.843 testes do tipo RT-PCR - considerado o padrão ouro para a detecção da doença. O número de insumos representa 24% do total de 1,1 milhão de procedimentos do tipo que foram realizados em Minas, conforme a Secretaria de Estado de Saúde. Outros 41 projetos de pesquisa desenvolvidos na UFMG, relacionados à crise sanitária, foram financiados por outros órgãos. 

“Nossas contas de água, luz... tudo tem sido pago com muita dificuldade porque estamos priorizando as atividades-fim que são ensino, pesquisa e extensão. Não abrimos mão da qualidade da instituição”, reitera Sandra Regina.

A professora relata que para manter o pagamento de bolsas de estudo a alunos de baixa renda e financiar projetos de pesquisa e extensão, a UFMG tem feito cortes em contratos de manutenção e economias diárias como redução do uso do ar condicionado. Sem autorização para realização de concursos, a contratação de terceirizados também foi interrompida. 

De acordo com a reitora, desde 2015 foram feitas dezenas de demissões na UFMG. Cargos também foram suspensos pelo governo federal e há dificuldades para recomposição. “Há uma defasagem enorme. Em 2016 junto com o teto de gastos, o governo também fez um decreto que cancelou vários cargos que tínhamos, que foram excluídos. Quando temos uma aposentadoria, não tem uma reposição de cargos. Toda a parte de atendimento, manutenção, limpeza tem que ser terceirizada, não temos mais carreiras. Se formos olhar isso, são mais de mil servidores”, contabiliza a reitora.

Sandra Regina exemplificou a necessidade atual da UFMG em contratar contínuos para trabalhos na biblioteca universitária. No entanto, não há verba para as contratações, prejudicando diretamente o atendimento aos estudantes. Também faltam técnicos para a emissão de diplomas. “Muito embora a gente priorize o ensino, pesquisa, extensão, toda equipe é afetada pelos cortes. Se não tenho pessoas para limpar os laboratórios, como as pessoas vão trabalhar? Se não tiver funcionário no serviço administrativo, quem vai preencher formulários sobre vacinas?”, questionou a gestora. 

Sobrecarga de trabalho

A presidente do Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco, Maria Rosaria Barbato, denuncia que a redução no número de servidores técnicos e administrativos está resultando em sobrecarga de trabalho também aos docentes que tiveram de incorporar demandas fora do escopo de atuação. 

Outro problema aos educadores é a reposição. Os professores substitutos, segundo Maria Rosaria, estão sendo recrutados com salários menores. “Esses cortes levam diretamente à precarização do trabalho docente”, analisa. As funções extras são adicionais a uma perda inflacionária de 20% nos vencimentos, se considerado somente o intervalo entre 2019 e 2022. “Se houver algum aumento aos servidores públicos no próximo ano será apenas de 3%”, lamenta. 

Orçamento não acompanhou o crescimento da universidade 

Ao longo dos últimos anos, a UFMG experimentou um crescimento importante no número de alunos matriculados. Em 2009, antes de políticas de democratização de acesso, como a Lei de Cotas, a instituição recebia cerca de 30 mil alunos, número que, atualmente, se aproxima de 50 mil, segundo a reitora Sandra Regina Goulart.

“Não foi ampliado só o número de alunos, de cursos. Foi necessário ampliar o espaço físico da instituição, corpo docente. Estamos melhores, somos destaques em rankings nacionais e internacionais, mais inclusivos pela Lei de Cotas, só que nosso orçamento está de volta a 2009”, lamentou a reitora. 

Na avaliação da gestora, o teto de gastos públicos é um entrave para o funcionamento da universidade, que observa anualmente um aumento em gastos primários como luz, água e folhas de pagamento. Ela defende que ciência, tecnologia e educação sejam vistos como investimentos e não como gasto. “Se continuar sendo visto assim, vamos estar sempre a reboque de orçamentos. O país tem receita, mas não pode gastar por causa do teto de gastos porque não tem como investir além do valor da inflação”, afirma. 

Sem dinheiro para o básico, obras estão paradas nos campi da UFMG desde 2015 e sem previsão de retomada. Em 2017, O TEMPO mostrou que o futuro de ao menos sete intervenções, em prédios distintos, enfrentavam limitações orçamentárias. Número que não foi atualizado até a publicação desta matéria.

Para 2023, a expectativa é que o montante a ser disponibilizado seja baixo, semelhante ao empenho de 2021. “A previsão que temos é de um orçamento que vai ser 16% menor que 2021. É um corte orçamentário que nos impede de cumprir nossa missão da maneira que precisamos e possibilitando mais desenvolvimento social, sustentável e econômico”, refletiu Goulart. 

Aprendizagem precarizada 

Presidente do Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco, Maria Rosaria Barbato afirma que a redução nos investimentos em educação tem dificultado a produção científica no Brasil. Ela relembrou o corte de R$ 1,6 bilhão, confirmado pelo Ministro da Educação em junho, no orçamento das universidades federais neste ano. 

Barbato relata que o problema se reflete na compra de insumos para pesquisa e abastecimento de materiais químicos. “Como fazer pesquisa sem pagar contas de água, luz, sem papel higiênico, sem segurança e limpeza que garanta a assepsia necessária?”, indaga a presidente.

A coordenadora geral do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFMG, Luiza Datas, afirma que os estudantes estão enfrentando uma série de sucateamentos. Exemplos, conta, são banheiros em condições inadequadas, baixo número de funcionários para limpeza e até problemas de iluminação nos horários noturnos.

“No primeiro semestre os estudantes sentiram falta de iluminação melhor no campus e isso gera insegurança”, afirma. Outra queixa diz respeito aos valores das bolsas de assistência estudantil e de projetos de extensão e pesquisas que também não são atualizados. 

Os repasses variam entre R$ 400 a R$ 800, segundo a representante do DCE. “Visto a crise que a gente vive, (o valor) é muito pequeno. E a gente fica afetado porque o estudante precisa de bolsa para conseguir manter a subsistência dele, mas o valor da bolsa não é suficiente”, diz”.

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