A investigação da Polícia Federal para desarticular o plano de fuga de lideranças do PCC (Primeiro Comando da Capital) mapeou o uso de códigos, como "STF" e "STJ", para designar as táticas que seriam utilizadas na ação de resgate.
Na decisão que autorizou a ação da PF, o juiz do caso cita que foi identificado um documento com as citações a STF e STJ se referindo ao plano de fuga e "à prática de sequestro de autoridades do Sistema Penitenciário Federal e/ou seus familiares, com ordens, inclusive, para a prática de homicídios".
A apuração começou em dezembro de 2021 após o setor de inteligência do Depen (Departamento Penitenciário Federal) informar à PF que lideranças do PCC, em conversas com advogados, citavam nomes de defensores e "recursos ao STF (Supremo Tribunal Federal) e STJ (Superior Tribunal de Justiça)" para cobrar o andamento do plano.
A PF então descobriu que os nomes dos advogados e dos recursos às cortes superiores não existiam de fato e passou a apurar a suspeita de uso de códigos para designar os planos de fuga.
A partir daí, com base em interceptações telefônicas, quebras de sigilo telemático e conversas gravadas no parlatório dos presídios federais, os investigadores descobriram a existência de possíveis três planos de fuga articulados pelos advogados e por integrantes da facção em liberdade.
O primeiro deles, designado pelo código "STF", mirava a fuga de lideranças, entre elas Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, por meio da invasão do presídio federal em Brasília.
Segundo apurou a reportagem, nesse plano estava previsto utilizar a tática do novo cangaço, empregada por integrantes da facção em roubos a bancos no interior do país. A ideia envolveria cercar o presídio em Brasília e resgatar Marcola e outras lideranças.
Dados coletados pelos investigadores apontam que o plano utilizaria de 40 a 60 homens fortemente armados, que participariam do ataque à penitenciária de segurança máxima.
O outro plano, chamado de STJ, mirava o sequestro de diretores do Depen para posterior troca pela liberdade das lideranças da facção.
Nessa caso específico, segundo a PF, o objetivo seria trocar a liberação dos servidores pela liberdade de um integrante da facção apelidado de Ciro -os investigadores apontam que Ciro seria Marcola.
Um terceiro plano, batizado de Suicida, seria gerar uma rebelião no presídio federal para facilitar a fuga das lideranças com tomada de servidores públicos como reféns.
A PF afirma que tomou várias medidas para evitar que os planos fossem colocados em prática desde que percebeu a intensificação dos pedidos das lideranças, entre elas Marcola, para que os advogados acionassem os responsáveis pela execução.
Segundo conversas interceptadas, em junho deste ano, o plano de resgate da cúpula do PCC estava "95% pronto"??.
"Para organizar as atividades ilícitas, os investigados se valiam dos atendimentos e das visitas em parlatório, usando como códigos para a comunicação situações jurídicas que, comprovadamente, não existiam de fato", diz a PF.
A operação deflagrada na manhã desta quarta (10), que contou com cerca de 80 policiais federais e cumpriu mandados de prisão e buscas e apreensão, é uma dessas medidas e visa, também, avançar na apuração dos envolvidos no planejamento dos crimes.
A ação foi batizada de Anjos da Guarda e tem o apoio do Departamento Penitenciário Nacional. Os presos alvos do plano de fuga estão detidos nas penitenciárias federais de Brasília (DF) e Porto Velho (RO).
Entre os presos que seriam resgatados estão, além de Marcola, lideranças da facção como Cláudio Barbará da Silva, o Barbará, e Valdeci Alves dos Santos, o Colorido.
Um dos mandados de busca e apreensão foi cumprido em uma residência da mulher de Marcola localizada em Alphaville, na Grande São Paulo. Ela mora com a irmã, e é advogada apontada como integrante do grupo que planejava os ataques para resgatar os presos. A mulher e a cunhada de Barbará foram presas na ação.
A reportagem não localizou a defesa de Marcola, sua esposa e cunhada.
Para entender que STF e STJ eram códigos utilizados para designar os planos de fuga, os investigadores analisaram conversas gravadas no parlatório dos presídios federais desde 2020.
Nessas conversas, eles afirmavam que iriam "trocar o advogado" em caso de não realização do plano de fuga. A polícia suspeita que essa era uma ameaça aos próprios defensores, também em forma de código.
Além das conversas gravadas, um documento apreendido numa quebra de sigilo telemática mostrou aos policiais que "STF" era o plano para invadir o presídio federal de Brasília e resgatar Marcola.
Após a descoberta, Marcola foi transferido de Brasília, em março de 2022, para a penitenciária federal de Porto Velho (RO). Embora preso, ele foi alvo de outro mandado de prisão na operação desta quarta (10).
A reportagem apurou que o plano de fuga é arquitetado há anos pelo grupo criminoso e teve início quando Marcola ainda estava preso no sistema penitenciário estadual de São Paulo.
(Fabio Serapião / Folhapress)