Ouça episódio da série Cem anos do rádio no Brasil sobre as transformações tecnológicas do rádio:
Os custos de apuração e transmissão da notícia também diminuíram, como destaca Heródoto Barbeiro. “Fui muitas vezes fazer reportagem na rua, e você tinha que pedir uma linha telefônica e ir lá para o aparelho. Hoje você pode fazer do seu celular, do seu laptop. O custo técnico de emissão de som caiu vertiginosamente”.
Além da agilidade de cobertura conquistada pelo jornalismo em geral, a presença do rádio no meio virtual criou novas interações com o conteúdo. Jornais de emissoras de rádio passaram a ser exibidos no YouTube. Os programas das emissoras foram disponibilizados on demand, para que o público pudesse ouvir o programa quisesse e quando desejasse.
“Estou escrevendo um livro sobre os 150 anos do rádio, que vou lançar agora, e o primeiro capítulo fala do metaverso, que é a tecnologia mais avançada na internet. O rádio já está lá”, defende Barbeiro.
Ouça episódio da série Cem anos do rádio no Brasil sobre as web rádios:
Recentemente, o rádio ganhou um “irmão”: é o podcast, um formato popular e que já tem no jornalismo um dos segmentos com mais potencial e criatividade. Grandes reportagens, com riqueza de narrativas e até mesmo áudio dramatização, são sucesso de público.
Ferraretto afirma que, infelizmente, as rádios vêm deixando passar a oportunidade usar o podcast ao seu favor. “O podcast se constituiu à parte do rádio, que não soube usar o podcast. O radiojornalismo deveria ser o breaking news, a notícia na hora em que ela acontece, e o podcast pode ser uma ferramenta de aprofundamento da notícia”, analisa.
Se o rádio conseguiu expandir limites físicos e de plataforma para ganhar contornos globais, ele ainda assim não perdeu uma de suas principais características: a de ser o meio mais próximo do cidadão.
De acordo com o Atlas da Notícia, pesquisa que mapeia desertos de notícias (como são chamados municípios em que não há nenhum meio de comunicação com produção jornalística) e o jornalismo local no país, o rádio figurou como o meio de comunicação mais numeroso nos municípios brasileiros até a última edição, quando ele foi ultrapassado – por menos de 1% – pelo online.
Em 2021, eram quase cinco mil emissoras, o que corresponde a 33,5% do total de veículos com produção jornalística local. O rádio ainda está em primeiro no Centro-Oeste, no Sudeste e no Sul do país.
O coordenador do projeto, Sérgio Ludtke, afirma que esse número pode ser ainda maior. “Ainda estamos desbravando os municípios. E se a gente pudesse contabilizar rádios comunitárias que produzem jornalismo, provavelmente o rádio ainda seria o principal meio de comunicação que atende as audiências locais no país”.
Mesmo com tanta capilaridade do rádio e da expansão de meios online, o país está longe de se livrar dos desertos de notícia: 14% da população brasileira ainda vive sem acesso à produção local de informações, o que corresponde a 29 milhões de pessoas. Elas vivem em mais da metade dos municípios do país – mais precisamente 53%.
Um dado ruim para o exercício da cidadania e para a democracia brasileira, segundo Ludtke: “O jornalismo é um pouco fiscal do poder. É importante que exista fiscalização das obras, do papel da prefeitura, do poder local, que se tragam diferentes visões sobre o que está acontecendo na cidade. Essa informação é importante para que as pessoas formem consciência e possam tomar decisões maduras, incluindo o voto. Isso faz com que o jornalismo local seja um pilar importante para a democracia”.
Para o pesquisador, a presença do jornalismo é ainda mais importante depois que as redes sociais se tornaram onipresentes na sociedade. “As redes sociais propiciaram um trânsito de informações enorme, mas elas não são apuradas com técnicas jornalísticas, que possam ter rigor e seguir requisitos éticos. É um palco de muita informação falsa, também”.
Ainda que exista jornalismo local no município, no entanto, não há garantia de informação plural. É o que lembra Luiz Artur Ferraretto. “No interior do Brasil há uma realidade que nunca se alterou, que é a do coronelismo eletrônico. O dono da emissora ter relação com a política e usar a emissora para atender seus interesses. E uma outorga pública deveria ser concedida pelo Estado em nome da sociedade. Ela é pública, independente de ser comercial ou não”.
Os quase desertos de notícias, onde há um ou dois veículos, correspondem a 26% dos municípios. Situação em que a pluralidade tem menos chance de estar presente. “Não é que a gente garanta que vai ter um número maior de veículos independentes, mas é mais esperado que, em um ambiente com mais diversidade, na equiparação desses veículos a gente pode ter visões diferentes”, explica Sérgio Ludtke.
A sustentabilidade e a independência dos meios de comunicação local são, para o coordenador do Atlas da Notícia, o grande desafio. “Um veículo local independente é um empreendimento heroico. É muito difícil. A gente tem cada vez menos recursos vindos de publicidade. A publicidade em pequenas cidades é mais rara. É mais difícil que esses veículos tenham assinantes, e os veículos abertos, como emissoras de rádio, são muito dependentes de publicidade. E a publicidade nessas cidades vêm sobretudo do poder público local”.
A professora Valci Zuculoto também elege a sustentabilidade financeira como a principal demanda a ser resolvida pelas rádios. “Nosso cenário de jornalismo sonoro é muito amplo e tem muitas possibilidades. Só falta a gente conseguir fazer com que essas emissoras possam sobreviver”.
Em comemoração aos cem anos do rádio no Brasil, completados em 7 de setembro de 2022, a Agência Brasil publica uma série de reportagens sobre as principais curiosidades históricas do rádio brasileiro. Veja as matérias já publicadas:
Cem anos do rádio no Brasil: o padre brasileiro que inventou o rádio
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Cem anos do rádio no Brasil: das emissoras pioneiras até a Era de Ouro
Cem anos do rádio no Brasil: caráter educativo marca história da mídia
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O centenário do rádio no país também será celebrado com ações multiplataforma em outros veículos da EBC, como a Radioagência Nacional e a Rádio MEC que transmitirá, diariamente, interprogramas com entrevistas e pesquisas de acervo para abordar diversos aspectos históricos relacionados ao veículo. A ideia é resgatar personalidades, programas e emissoras marcantes presentes na memória afetiva dos ouvintes.