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Política

Pandemia, engajamento e biometria: as hipóteses para as altas abstenções nas eleições de 2020


Cidades avançadas no cadastramento biométrico têm números mais corretos de eleitorado e maior comparecimento. Na outra ponta, a crise sanitária, disputas mais mornas e facilidade de justificar o voto desestimularam o eleitor a sair de casa. Segundo turno das eleições 2020 tem 29,47% de abstenções de eleitores

A média de abstenções no segundo turno das eleições de 2020 chegou a quase 30% dos eleitores. Para especialistas consultados pelo G1, são três os motivos principais: a pandemia do coronavírus, a falta de engajamento do eleitor e a evolução do cadastramento biométrico.

Era esperado que a crise sanitária afetasse o comparecimento de eleitores às seções de votação. Em 2016, 21,6% dos eleitores não foram votar no segundo turno contra 29,4% neste ano.

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“É um número maior do que desejaríamos, mas é preciso ter em linha de conta que realizamos eleições em meio à pandemia que já consumiu 170 mil vidas, e as pessoas com temor, muitas por estarem com a doença, muito por estarem com medo”, afirmou neste domingo o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso.

Mas um levantamento feito pelo G1 mostra como fatores além da pandemia influenciaram as votações. Cidades que estavam em grau mais avançado do cadastramento biométrico tiveram, em geral, menores números de abstenção.

Isso acontece porque os Tribunais Regionais Eleitorais (TRE) são obrigados a passar um pente-fino em suas bases de eleitores e acabam eliminando pessoas que já não compareceriam às urnas. É o caso de quem teve o título de eleitor cancelado e de pessoas que morreram entre uma eleição e outra.

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Fernanda Garrafiel/Arte G1

Há exceções importantes, como a eleição de Goiânia. A cidade tem quase 100% de biometria cadastrada, mas é a líder em abstenções neste segundo turno, com 36,7%. Para o cientista político Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da consultoria Eurasia, a limpeza dos dados favoreceu os percentuais de abstenção, mas a falta de engajamento político foi fator mais importante.

“O ambiente social está menos conflagrado. Não houve uma revolta com a classe política como nas últimas eleições. E esse nervosismo foi apaziguado, principalmente, por uma sensação maior de bem-estar econômico em 2020”, diz Garman.

O especialista afirma que o Auxílio Emergencial e os robustos repasses para que os municípios combatessem a pandemia deixaram o ambiente mais ameno entre população e governantes, favorecendo a reeleição de prefeitos ao redor do país. Em caso de disputa pouco competitiva, como aconteceu em Goiânia e no Rio de Janeiro, o eleitor também perdeu a motivação para votar.

A lógica vale para o cenário inverso, de votações mais disputadas. Se havia dúvida sobre quem seria o vencedor — ou a temperatura da disputa estivesse mais alta —, o eleitor foi mais instigado a comparecer. Foi o que aconteceu em Recife, que teve um dos pleitos mais apertados dentre as capitais no segundo turno e mostrou índices de abstenção abaixo da média — apenas 21,2%.

“Em geral, foi um ambiente completamente atípico, em que 8% do PIB foi direcionado para políticas sociais. Não acredito em uma vitória da ponderação e a polarização deve retornar nas próximas eleições”, afirma Garman.

Segundo o cientista político Humberto Dantas, pesa também a dependência econômica da população em relação à máquina pública. Quanto mais robusta é a criação de empregos pelas prefeituras e maiores são os repasses de recursos à população economicamente ativa, maior a disposição de votar.

“O grau de dependência das pessoas em relação ao cofre público municipal deixam o eleitor mais engajado”, afirma Dantas. O especialista lembra ainda que a facilidade de justificar a ausência da votação pelo E-Título e as multas brandas para quem não vota são quesitos extras na diminuição do comparecimento.

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Fernanda Garrafiel/Arte G1

Para Adriana Brandão, diretora-geral do TRE-RJ, ainda é cedo para uma análise mais detalhada. "Fica difícil fazer uma análise nesse momento de pandemia, até porque a Justiça Eleitoral recomendou que as pessoas com sintoma não fossem [votar]. (...) Muita gente com medo", afirma.

Além disso, ela destaca o fato de que a Justiça Eleitoral não prosseguiu com o cancelamento de títulos em determinadas cidades pela dificuldade de regularização da situação eleitoral em meio à pandemia.

“No caso de São João de Meriti, por exemplo, fizemos a revisão [cadastro biométrico] de mais ou menos 80% do eleitorado. Para não prejudicar quem não fez a revisão [por causa do contexto de pandemia], o TSE suspendeu o cancelamento. Então os títulos das pessoas que não compareceram não foram cancelados e nós ficamos com esse percentual”, diz.

As outras quatro cidades do Rio que tiveram segundo turno, porém, têm níveis de cadastramento biométrico bastante baixos — entre 48% e 57%. Segundo Brandão, as taxas se explicam por conta da não obrigatoriedade da biometria nas eleições deste ano, já que a Justiça Eleitoral do estado contava com isso para atualizar sua base de dados.

“Aqui, no Rio, nós temos uma peculiaridade em relação aos outros estados. Nós temos um banco de identificação civil que fica a cargo do Detran do Rio. É uma base 'biometrizada'. Por meio de um convênio, tivemos 4,7 milhões de cadastros aproveitados dessa base. Desse total, um pouco mais de 3 milhões foram validados. Nós íamos validar [o resto] no momento da eleição. Mas, como não teve o uso da biometria, ficamos com a base de dados pendente de validação", afirma Brandão.

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