Em um caso controverso que despertou críticas à Justiça dos Estados Unidos, uma adolescente americana foi condenada nesta terça-feira (13) a cinco anos de liberdade condicional e ao pagamento de uma indenização por matar um homem que acusa de a estuprar.
A jovem de 17 anos se declarou culpada pelo assassinato de Zachary Brooks, 37, ocorrido em junho de 2020. Ela admitiu tê-lo esfaqueado 30 vezes, enquanto ele dormia, após sofrer abuso sexual mais de uma vez. O juiz David M. Porter, do estado de Iowa, determinou que a americana, além de passar cinco anos em liberdade condicional, seja colocada em uma instituição residencial para jovens e mulheres e use um dispositivo de rastreamento.
O pagamento de US$ 150 mil (R$ 778 mil) em restituição à família de Brooks é obrigatório no estado para crimes de homicídio. Caso viole as regras da liberdade condicional, no entanto, ela pode ser enviada para uma prisão e cumprir pena de até 20 anos pelos crimes de homicídio culposo e lesão corporal.
A adolescente, que é negra, e sua defesa afirmam que ela estava sendo submetida a tráfico sexual por Christopher Brown, homem que a acolheu em casa após ela deixar a residência dos pais e se dizia seu namorado, mas exigia que ela fizesse sexo com outros homens em troca de dinheiro, e que consumisse álcool e drogas.
Ela teria sido forçada à ir à casa de Brooks, um conhecido de Brown, e foi abusada sexualmente mais de uma vez quando estava inconsciente. Quando acordou e se deu conta dos abusos, ela o teria esfaqueado. Em depoimento prestado na terça, a adolescentesegundo relatos do jornal americano The New York Times, disse que desejava que a sequência de eventos daquele dia nunca tivesse ocorrido.
Ela, porém, criticou a decisão judicial. "Isso significa que eu enfrento estupro, abuso, ódio, manipulação, abandono, perda dos meus pais e solidão." A defesa da americana tenta acusar Brown por favorecer a prática de tráfico sexual, mas ele ainda não foi indiciado. Promotores do caso alegaram durante o processo que Brooks estava dormindo quando foi esfaqueado e, portanto, não representava um perigo imediato.
Dados compilados pela Fundação Congressional Black Caucus, ligada à bancada de parlamentares negros, em relatório publicado em 2020, apontam que meninas e mulheres negras são submetidas com mais frequência ao tráfico sexual. Cerca de 40% das vítimas do crime nos EUA são mulheres negras, embora representem cerca de 13% da população americana.
Entre os principais motivos, estaria o fato de que mulheres negras são maioria entre as camadas pobres da população, e a precariedade socioeconômica, agravada por fatores como desemprego e dívidas financeiras, favoreceria a atuação de traficantes entre esse grupo.
O caso despertou críticas nas redes sociais, com usuários afirmando que condenar uma adolescente por matar seu estuprador seria um equívoco. Leland Schipper, americano que afirma ter sido professor da jovem, iniciou uma campanha de arrecadação virtual que recolheu, até a tarde desta quarta (14), US$ 228 mil para ela.
Ele afirma que o valor seria destinado a pagar a indenização e que o excedente pode ajudar a adolescente com os custos da educação superior -durante os dois anos em que ficou detida em um centro de detenção juvenil, do assassinato até o julgamento, ela recebeu o diploma do ensino médio.
"Ela não deve justiça à família daquele homem. Ela não merece ficar sobrecarregada pelo resto de sua vida porque Iowa escreveu uma lei que não dá aos juízes qualquer poder sobre como ela é aplicada. Esta lei não faz sentido em muitos casos, mas neste caso, é moralmente injustificável", escreveu o professor.
Casos semelhantes a esse já mobilizaram os Estados Unidos. Em 2019, o governador do Tennessee concedeu perdão a Cyntoia Brown, mulher que cumpriu 15 anos de prisão perpétua por matar um homem quando era uma adolescente vítima de tráfico.
(Folhapress)