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Indígenas Krenak enfrentam BHP na justiça britânica por tragédia em Mariana

Por Redação

13/12/2022 às 17:10:11 - Atualizado há

Representantes da comunidade indígena Krenak enfrentaram, nesta terça-feira (13), pela primeira vez, em um tribunal de justiça britânico, a gigante da mineração anglo-australiana BHP, em uma ação coletiva sobre a pior catástrofe ambiental da história do Brasil.

Cinco líderes Krenak quiseram estar presentes nos dois dias de vistas preliminares perante a juíza Finola O'Farrell, da Alta Corte de Londres, após os quais se espera que seja agendada uma data para o início do julgamento, em 2023.

Após viajarem a Londres a bordo de três aviões que saíram da cidade mineira de Governador Valadares, eles compareceram ao tribunal nesta terça, alguns usando seus tradicionais cocares e todos vestindo casacos pesados para enfrentar o frio glacial que afeta o Reino Unido. Nesta etapa inicial, eles não devem testemunhar.

"Queremos lutar não só pela comunidade Krenak, como também pelas demais pessoas afetadas", explicou à AFP Marcelo Batista Santana, de 31 anos, presidente do conselho sanitário de uma cidadezinha de aproximadamente 600 habitantes, e genro da matriarca Djanira de Souza Crenaque, que aos 72 anos também fez a viagem de quase dois dias.

"Estamos aqui para que nossos direitos sejam respeitados e para que nossa comunidade seja respeitada, o que não ocorreu desde que a represa colapsou", acrescentou.

Em 5 de novembro de 2015, a barragem de Fundão, próxima das cidades de Mariana e Bento Rodrigues, em Minas Gerais, se rompeu, liberando mais de 40 milhões de metros cúbicos de resíduos de minério, altamente poluentes.

A enxurrada de lama percorreu 650 km pelo Rio Doce até chegar ao Atlântico, destruindo cidades, matando 19 pessoas e devastando a flora e a fauna nas terras dos Krenak, que até hoje não podem ter acesso às águas contaminadas de um rio essencial para seu povo.

"Nossa gente sempre teve uma relação espiritual e cultural com o rio, que sempre esteve ali para nos proteger" como um deus, afirma Batista, que se reunirá na quarta-feira, juntamente com outros quatro líderes indígenas, com um grupo de deputados britânicos para explicar-lhes sua situação.

Agora, "os anciãos sofrem porque sentem falta do rio e os jovens sofrem porque não chegam a conhecer o rio (...) e crescem sem saber como era fazer parte dessa cultura", acrescenta.

Julgamento em Londres sob a lei brasileira

Os demandantes, quase 200.000 pessoas e entidades do Brasil, que incluem empresas, associações religiosas e municípios, exigem uma indenização da BHP como proprietária de 50%, em conjunto com a mineradora brasileira Vale, da empresa Samarco, à qual pertencia a barragem.

A BHP "nega as acusações em sua totalidade" e argumenta que foram desembolsados 11,5 bilhões de reais (2,16 bilhões de dólares) em indenizações e ajudas financeiras de emergência para mais de 400.000 pessoas através da Fundação Renova, que gerencia a reparação e a compensação.

"Acreditamos que a ação coletiva é desnecessária, já que duplica questões cobertas pelo trabalho da Fundação Renova (sob supervisão dos tribunais brasileiros) e outros procedimentos legais no Brasil", afirmou seu porta-voz londrino, Neil Burrows.

Para chegar até aqui, a ação coletiva teve que superar quatro anos de uma via-crúcis jurídica. Em novembro de 2018, os advogados apresentaram uma das maiores ações da história judicial britânica, reivindicando à BHP cerca de 5 bilhões de libras (6 bilhões de dólares), perante um tribunal de Liverpool, no noroeste da Inglaterra. Mas um juiz avaliou que não tinham direito de litigar na Inglaterra e o caso foi encerrado em 2020.

No entanto, um ano depois os advogados conseguiram uma moção inusual para reabrir o processo, apelaram e em abril de 2022 a justiça da Inglaterra se declarou competente, apesar de a catástrofe ter acontecido em outro país e de a juíza precisar basear sua futura sentença em uma legislação estrangeira.

"Dado que a catástrofe ocorreu no Brasil, a lei aplicável é a lei brasileira", explicou o advogado Tom Goodhead. Mas "os tribunais ingleses estão muito acostumados a proceder assim", assegurou, pois "a lei que se aplica é a do país onde ocorreram os fatos".

Outros grupos protegidos pela Constituição brasileira, como os indígenas Guarani, Tupiniquim, Pataxó e a comunidade quilombola se somarão ao processo em fevereiro, acrescentou.

O Ministério Público de Minas Gerais estima que houve cerca de 700.000 afetados pelo desastre e para o escritório jurídico Pogust Goodhead, as indenizações têm sido muito insuficientes.

Mas sua aspiração ainda pode ser frustrada pela BHP, que pediu autorização ao Supremo Tribunal britânico para recorrer da jurisdição.

(AFP)

Fonte: O TEMPO
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