O Estado de Minas percorreu. de 24 a 26 de janeiro, todo o trajeto entre BH e Vitória para detalhar a perigosa jornada de quem usa as rodovias como rota de lazer, trabalho ou mora às margens delas. Pessoas como o operador de máquinas Antônio Amélio, de 40 anos, que encontramos por volta das 9h30 da terça-feira passada, trocando um dos pneus do carro no Km 195 da BR-262, em Bela Vista de Minas. “Estou vindo de Vitória e os pneus estouraram quatro vezes. Não tem condições esse trajeto”, desabafou.
Antônio viajou de Belo Horizonte com a mulher e seus três filhos, um de 11 anos e dois gêmeos recém-nascidos, com 30 dias de vida, para visitar a sogra, em Vitória. Mas o que era para ser um agradável passeio em família virou um enorme transtorno na tentativa de voltar para a capital mineira. “Estamos parados desde as 23h de ontem (segunda). Paguei um táxi para deixar minha família numa padaria, para minha mulher trocar as crianças e se alimentarem e estou aqui. Todo o dinheiro que tinha eu gastei com pneu. Agora, como que eu vou embora?”
Foram mais de R$ 1 mil de prejuízo em um trecho de poucos quilômetros e desagradáveis surpresas. “As crateras são gigantes. Passei numa vala e estouraram dois pneus. Andei quatro quilômetros e estourou mais um. Andei mais dois e estourou o resto. Isso não é problema do carro, é da rodovia”, lamentou Antônio. Ele e a família passaram a noite à beira da estrada, sem receber ajuda, mesmo após ligar para a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e para o Corpo de Bombeiros. Na noite de terça (24/1), Antônio entrou em contato com a reportagem para avisar que ele e a família tinham, enfim, chegado em casa, após uma viagem de volta que durou 24 horas.
BONANÇA ANTES DO TORMENTO
No caminho entre BH e Vitória, bem antes do trecho onde encontramos Antônio, o trajeto de 56 quilômetros da capital mineira até Caeté é mais tranquilo, fora um ou outro momento de lentidão provocado pela presença de veículos de grande porte. A BR-381 é uma importante rota para transporte rodoviário, por cortar a Região Central de Minas, e a grande presença de mineradoras faz com que o tráfego de caminhões e carretas seja intenso.
Logo após deixar Caeté, começa o trecho de rodovia duplicada, obra que vem sendo entregue em partes desde 2019. Com menos de quatro anos de utilização, a situação da rodovia assusta. Vários pontos com afundamentos, fissuras e desgastes podem ser encontrados no trecho. E quanto mais se anda, mais a situação piora.
Veículos de pequeno porte e carretas precisam trocar rapidamente de faixa para escapar dos pontos onde a pista está em situação péssima. Cerca de três quilômetros antes do trevo de Nova União, rachaduras chegam a 4m de comprimento. Chama atenção ver uma rodovia tão nova com rachaduras profundas, de até 73cm de largura e que ocupam toda a faixa central. Os afundamentos são tão grandes que, quando as carretas que pesam toneladas não conseguem desviar a tempo, parece que os veículos descem um degrau de escada. O problema se repete em muitos pontos dos 55km da duplicação.
Poucos quilômetros à frente, próximo à entrada de São Gonçalo do Rio Abaixo, começa um percurso que explica o porquê de o caminho entre a cidade e João Monlevade ser considerado um trecho crítico da BR-381, apelidado de Rodovia da Morte. O asfalto está completamente desgastado e cheio de ranhuras e rachaduras. Próximo a São Gonçalo, as faixas amarelas que separam os sentidos estão apagadas.
Deixando João Monlevade para trás, é preciso mudar de rodovia para continuar até Vitória. A BR-381 segue rumo a Governador Valadares e o viajante que pretende chegar ao Espírito Santo passa a trafegar pela BR-262, visto pela reportagem como o ponto mais crítico do trajeto.
E a situação precária da estrada não demora muito a se mostrar. Já nos primeiros 50 metros, muitos buracos. E, menos de 500 metros após a entrada na BR-262, a pista cedeu e deu lugar a um buraco de 8m de largura por 8m de profundidade que toma praticamente toda a faixa da direita, no sentido BH. Carros e carretas precisam invadir a contramão para passar pela pista que cedeu. Há pouca sinalização e nenhum sistema de pare e siga, a não ser o adotado por iniciativa dos próprios motoristas.
Buracos definem o caminho
Logo após o Km 181, em São Domingos do Prata, carros e carretas ziguezagueavam entre as pistas para fugir da quantidade enorme de buracos. Mão e contramão, na prática, não existem. Quem define os sentidos são as crateras. No Km 177, contamos cerca de 50, de tamanho considerável, numa distância de apenas 800 metros.
Pouco mais à frente, encontramos uma grande carreta tombada no acostamento do sentido Vitória. Dois seguranças armados, que faziam a escolta particular da carga, estavam há 24 horas esperando que o veículo fosse retirado. A causa do acidente não poderia ser outra: buracos.
“Perdi o controle e tombei para o barranco, mas poderia ter pegado alguém de frente, ter tombado em cima de alguém. Aí a culpa ia ser minha. Além de colocar em risco a nossa vida, também coloca em risco a vida de terceiros”, disse o caminhoneiro Bruno Pereira Batista. Ele saiu de Campinas e, após não ver um buraco, acabou tombando próximo a São Domingos do Prata. “Tá crítica a situação da estrada, sem sinalização. Se acontece um acidente ninguém dá apoio, não vêm sinalizar. Os buracos já tão velhos. Tem grama nas crateras”, comentou.
Entre os Kms 195 e 181, ainda em São Domingos do Prata, há mais buracos e outra cratera, que desta vez destruiu metade da pista no sentido BH. Lá, encontramos um homem que colocava sobre sua bicicleta uma segunda roda de carro, com pneu e tudo, abandonada às margens da rodovia.
Na região, encontramos também Márcio Vieira Santos, de 48, dono de uma borracharia 24 horas. Ele afirmou que, de um ano pra cá, a demanda de clientes aumentou muito e que precisou pedir ajuda ao filho, atualmente em férias escolares, para dar conta de tanto serviço. “São 40 carros, só por causa de buracos. A estrada está ruim, mas ruim mesmo. Não estou dando conta. Comprei remessas de pneus quatro vezes entre novembro e dezembro. A gente não dorme mais, pois tem de socorrer o pessoal”, afirmou.
Demora em perímetro urbano
Em Abre Campo, na Zona da Mata, somente zigue-zagues e invasões de contramão possibilitam que os motoristas não caiam em diversos buracos no Km 97. Ainda assim, vez ou outra fica impossível escapar. Na altura dos municípios de Matipó e Bom Jesus, a estrada volta aos seus piores momentos, vistos entre João Monlevade e São Domingos do Prata. Depois daí, cerca de 8 quilômetros de trégua, com a estrada melhor até Realeza, distrito de Manhuaçu.
De lá até Manhumirim, a estrada está impraticável, com muitos buracos, desníveis e deformações. Como a rodovia passa dentro do perímetro urbano de Manhuaçu, esses problemas se acentuam com a presença de maior número de carros, ônibus e pedestres. Demoramos 16 minutos para fazer um percurso de 4,2 quilômetros, apesar de o local não ter semáforos, faixas de pedestre e redutores de velocidade. O limite de velocidade no local é de 50km/h.
Depois de Reduto, perto da divisa com o Espírito Santo, as coisas melhoram um pouco, mas as fortes chuvas da semana passada deixaram trechos com terra e alagamentos. Já no Espírito Santo, da divisa ao posto da PRF, no Km 131 da BR-262, em Brejetuba, a rodovia alterna 65 quilômetros de trechos bons e ruins. Nenhum que se compare aos piores locais da 262 em Minas, mas ainda assim precários em certos momentos. Depois, percebemos o que muitos motoristas tinham relatado: condições melhores das estradas no lado capixaba até a capital, Vitória.