A má fama que tornou a BR-381 conhecida como “Rodovia da Morte” no trecho entre Belo Horizonte e João Monlevade e a marca trágica que a estrada detém, de maior número absoluto de acidentes e vidas perdidas em Minas Gerais – foram 154 óbitos em 2022 –, traz a sensação de risco iminente para quem precisa viajar por ela. Mas uma análise proporcional sobre a letalidade das colisões mostra que a chance de se morrer em um desastre na BR-251 (Pedra Azul-Unaí) foi 4,2 vezes maior do que na 381 no último ano. Mesmo com total menor de óbitos, que somaram 58 em 2022, a proporção de mortos foi muito maior nos 220 acidentes registrados no trecho – o mais grave índice de letalidade em Minas Gerais. No mesmo período, a BR-381 registrou 2.449 ocorrências, ficando com a nona pior taxa. Na BR-267, a possibilidade de não sobreviver a um acidente é 3,4 superior; na BR-153, duas vezes; e na BR-365, 1,9 vez, tornando essas as rodovias mais letais do estado no ano passado, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) aos quais a reportagem do Estado de Minas teve acesso (veja quadro). Na avaliação do mestre e consultor em transportes e trânsito Silvestre de Andrade Puty Filho, a estatística comprova que é muito mais perigoso proporcionalmente, trafegar por essas estradas do que propriamente na Rodovia da Morte. “O volume de veículos em rodovias como a BR-381 e a BR-040 é muito grande. Se de 3% a 5% desse tráfego se envolver em acidentes, isso dilui o número de mortos. Quando temos vias de tráfego muito menos intenso, com acidentes resultando em índices mais graves de mortes, isso é um indicador de que se tratam de trechos muito mais perigosos”, afirma. A BR-251 vem chamando a atenção também pelo índice de mortalidade concentrado em determinados trechos: com 15 óbitos em 2022 em segmento de 10 quilômetros, em Francisco Sá, no Norte de Minas, foi considerada a mais mortal do país, segundo dados do painel da Confederação Nacional do Transporte (CNT) de Consultas Dinâmicas dos Acidentes Rodoviários. O trecho da BR-381 entre Contagem e Betim foi a segunda pior em Minas Gerais e terceira do Brasil. Em relação à 251, de acordo com dados da PRF, o trecho mais crítico da rodovia são os 18 quilômetros entre Francisco Sá e Grão Mogol, onde estão os 10 segmentos onde ocorreram acidentes com mortes em 2022, média de um a cada 1,8 quilômetro. Nesse percurso, há descidas fortes e subidas, com 18 curvas (média de uma por quilômetro), com registro de 12 acidentes, nos quais 70 pessoas ficaram feridas e 18 morreram. Na estrada como um todo, entre os acidentes cujas condições puderam ser esclarecidas pelos agentes da PRF, as colisões frontais foram as principais responsáveis por mortes, com 43 óbitos e 48 feridos em 28 ocorrências. O fator mais presente nessa tragédia rodoviária, ainda segundo a PRF, é a alta velocidade ou velocidade incompatível para o trecho, causa relacionada a 31 mortes e a 63 pessoas feridas em 23 acidentes. O mais grave desastre na BR-251 no ano passado ocorreu em 26 de março, quando seis pessoas morreram e uma ficou ferida na batida de frente entre um carro e uma carreta carregada de gesso. O veículo de carga, que descia a Serra de Francisco Sá, perdeu os freios na altura do Km 476 e invadiu a contramão, atingindo o veículo de passeio que vinha no sentido contrário. No carro morreram na hora dois homens, duas mulheres e duas crianças.
Números de uma rotina de tragédias
A segunda rodovia mais letal em Minas, a BR-267, tem seu trecho mais crítico nos 22 quilômetros entre Baependi e Aiuruoca, no Sul do estado. São sete segmentos onde ocorreram nove acidentes com 13 mortes e 10 feridos em 2022. É um percurso sinuoso, com nada menos do que 31 curvas, média de uma a cada 1,4 quilômetro. Em 3 de julho de 2022 ocorreu um dos piores desastres do ano na estrada, quando três pessoas morreram no Km 146, na altura de Lima Duarte, na Zona da Mata, depois que o carro em que estavam bateu de frente em um caminhão. Outras duas pessoas também do automóvel foram socorridas com ferimentos. Já na BR-381, no trecho de Belo Horizonte e João Monlevade, conhecido como Rodovia da Morte, em 2022 foram registrados 52 trechos com acidentes que resultaram em óbitos em percurso de 100 quilômetros. A PRF contabilizou 65 desastres, com 57 feridos e 75 mortos, média de uma morte a cada 1,3 quilômetro. A segunda estrada com mais mortes em números absolutos é a BR-040. Um dos trechos mais violentos é o de 42 quilômetros entre Congonhas e Conselheiro Lafaiete, na Região Central de Minas. Nesse percurso, há 15 segmentos com desastres que resultaram em óbitos em 2022. Foram 15 acidentes em que 19 pessoas se feriram e 18 perderam a vida. A média é de um acidente a cada 2,8 quilômetros e de uma morte a cada 2,3 quilômetros.
Descaso traça o mapa do perigo
O simples conhecimento de que há trechos mais críticos e estradas mais letais deveria mobilizar autoridades para que medidas urgentes fossem tomadas em rodovias como a BR-251, BR-267, BR-153 e BR-365, as mais mortais de Minas Gerais. A avaliação é do mestre e consultor em transportes e trânsito Silvestre de Andrade Puty Filho. “Quando há concessão, o Estado teoricamente pode cobrar da concessionária que tome medidas preventivas, que duplique prioritariamente trechos. Mas, nas rodovias que são gerenciadas pelos órgãos de governo, o próprio Estado não cobra atitude de si mesmo”, afirma o especialista. Na BR-381, por exemplo, o consultor destaca a mobilização social que resultou nas obras de duplicação, iniciadas em 2014, e as concessões como a da BR-040, que deveriam liberar o poder público para cuidar melhor de rodovias de tráfego menos intenso, mas que proporcionalmente estão matando mais. “Infelizmente, o que vemos é ineficiência em todos os lados. As obras da BR-381 são intermináveis e se tornaram um perigo em si mesmas. A concessão da BR-040 não duplicou os trechos mais críticos e a concessionária já devolveu a rodovia, aguardando agora nova licitação. Enquanto isso, as demais ficaram na mão do poder público, sem guincho, ambulância, manutenção”, critica. “E não há para quem reclamar. Se um acidente derruba placas, guardrails e divisórias de vias, os elementos de segurança vão desaparecendo e a gravidade dos acidentes, aumentando”, afirma o consultor. No período de chuvas, o engenheiro e especialista em transporte e trânsito destaca que a situação é ainda pior, com o escorregamento de taludes, pedaços da pista sendo levados e os buracos se multiplicando.
O que dizem os órgãos oficiais
A PRF informou que em Minas Gerais promove policiamento e patrulhamento diuturno nas rodovias de sua circunscrição. “A instituição está atenta ao cometimento de infrações por parte dos condutores. Além disso, a PRF utiliza uma ampla base de dados estatísticos para aprimorar de forma constante os pontos de fiscalização, bem como para modernizar a forma de abordagem aos condutores”, informa a corporação, acrescentando que se empenha em proporcionar mais segurança e promover ações educativas para motoristas. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) sustenta que o trecho da BR-381 sob sua responsabilidade (de BH a Governador Valadares) “está totalmente coberto por contratos de manutenção”. “Foram duplicados dois lotes de obras, e o restante está no plano de Concessões Rodoviárias do governo federal”, informa. Com relação à BR-365 em Minas, o departamento informa que está previsto na Lei Orçamentária Anual de 2023 recurso para obras de adequação entre Patos de Minas e Patrocínio, com projetos em fase de elaboração e com conclusão prevista até o fim do ano. Depois, sustenta, as obras poderão ser licitadas conforme plano a ser definido pelo governo federal. Sobre a BR-251, o Dnit informa ter sido finalizado Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental referente ao trecho do Km 526,1 ao Km 795,9. E acrescenta estarem sendo tomadas providências para a licitação do projeto. Sobre BR-267/MG, o departamento informa ter sido contratado o mesmo estudo de viabilidade. “Ressaltamos ainda que as rodovias BR-251/MG, entre Palmital de Minas e Santo Antônio do Boqueirão, e BR-267/MG, entre Juiz de Fora e Leopoldina e de Juiz de Fora até o entroncamento com a BR-354, estão cobertas por contratos de manutenção”, conclui o texto. A reportagem procurou a Via-040, concessionária que administra a BR-040 entre Simão Pereira e a divisa com Goiás, mas, até o fechamento desta edição, não obteve posicionamento sobre a situação dos trechos críticos sob sua responsabilidade.