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Educação

Na pandemia, projetos sociais levam material escolar, cestas básicas e computadores para alunos


Em São Paulo, por exemplo, ONG distribui computadores e chips de internet para estudantes de escola pública. Conheça outras iniciativas pelo país. Projeto "Novo Sertão" permitiu que, durante a pandemia, jovens levassem instrumentos musicais para casa

Divulgação

No Pantanal, com as escolas fechadas, voluntários vão, de barco, levar livros a crianças de comunidades ribeirinhas. Em Manaus, um professor trabalha como motorista de aplicativo para sustentar seu projeto de educação para jovens de baixa renda. E na capital paulista, uma ONG criada na pandemia doa computadores e tablets para alunos de escolas públicas.

Pelo Brasil, iniciativas como estas buscam minimizar o impacto da suspensão das aulas presenciais. Com o aumento de casos de Covid-19 e o ritmo lento da vacinação no país, ainda não há perspectiva de normalização das atividades.

Por isso, ONGs e associações de voluntários pedem doações para manter seus projetos. Elas precisam arcar com os custos das iniciativas durante a pandemia e garantir que continuem funcionando após a crise.

Nesta reportagem, você conhecerá 8 ações sociais:

Projeto criado na pandemia doa equipamentos eletrônicos para estudantes

Professor dirige carro de app para levantar fundos e manter alunos longe do tráfico

No Pantanal, escola usa barco para atender crianças de comunidades ribeirinhas

Projeto de creche para crianças em vulnerabilidade doa cestas básicas

Adolescentes do sertão nordestino ganham instrumentos musicais para treinar em casa

Crianças refugiadas recebem reforço on-line de língua portuguesa

Projeto investe em alunos do 9º ano e os acompanha até o primeiro emprego

Cursinho popular doa tablets e chips de internet para alunos acessarem aulas on-line

Confira:

Projeto criado na pandemia doa equipamentos eletrônicos para estudantes

Daniel recebeu apoio do Papo Futuro para estudar à distância

Arquivo pessoal

“Na quebrada, a gente aprende que o importante é trabalhar, porque não dá para estudar sem ter alimento na geladeira”, diz Daniel Souza, de 21 anos.

Ainda assim, o jovem tenta encontrar uma forma de entrar na universidade.

Em 2020, com o dinheiro que havia juntado nos últimos meses como atendente de telemarketing, decidiu se dedicar exclusivamente às aulas de um cursinho gratuito — o Quantum, da Faculdade Albert Einstein (SP).

“Eu acordava às 4h, chegava às 7h e só ia embora às 22h30. Era cansativo, mas eu tinha toda a estrutura, ficava em um ambiente tranquilo, com apoio dos professores e cercado de pessoas que prezavam pelo estudo. Era estimulante”, conta.

Mas, em março, por causa da Covid-19, as aulas passaram a ser on-line. E os obstáculos aumentaram: Daniel não tinha nem celular, nem internet. Foram dois meses sem estudar.

A solução veio por meio da ONG Papo Futuro, criada durante a pandemia para doar equipamentos eletrônicos e chips de internet a estudantes de baixa renda. No Brasil, quase 40% dos alunos da rede pública não têm os equipamentos necessários para o ensino remoto.

“O projeto me ajudou com tablet, computador de mesa e wi-fi”, diz Daniel. “Consegui voltar a estudar. Quero entrar na USP, para mostrar que os negros podem chegar lá.”

Professor dirige carro de app para levantar fundos e manter alunos longe do tráfico

Girleno Menezes arrecada cestas básicas para famílias de alunos do projeto

Arquivo pessoal

Em 2016, o professor Girleno Menezes, afastado das salas de aula por questões médicas, fundou a Associação Voz Ativa. Seu objetivo: ocupar o tempo livre de jovens de comunidades vulneráveis de Manaus e mantê-los afastados do tráfico de drogas e da prostituição.

O projeto começou com aulas gratuitas de futebol americano. Aos poucos, foi ampliado: passou a incluir rodas de conversa nas escolas, palestras, cursos de violão e de tambor, e atividades de conservação ambiental.

Uma das ações foi até premiada: alunos de uma escola estadual discutiram as necessidades da comunidade, formularam pré-projetos de lei e foram à Câmara entregá-los para os vereadores.

“O problema é que é muito difícil fazer educação sem recurso. Com meu salário de professor, consigo pagar minhas despesas. Mas não sobra para ajudar os outros”, conta Girleno.

“Banco os projetos da associação levantando dinheiro como motorista de aplicativo e pedindo ajuda no farol.”

Quando um passageiro entra no carro, o professor fala sobre a Voz Ativa. Aos poucos, vai reunindo parceiros e voluntários — foi assim que conseguiu a doação de seis violões para as aulas de música.

Na pandemia, o desafio da associação é suprir as necessidades básicas das famílias. “Muita gente se mobilizou, e consegui 600 cestas básicas para doação. Levamos para as comunidades ribeirinhas”, diz.

Girleno entrega cestas básicas para família de Manaus

Arquivo pessoal

O celular de Girleno virou um canal de pedidos de socorro. Em uma das mensagens, uma mulher diz:

“Gostaria de um apoio seu. Minha amiga, desempregada, perdeu o pai e a mãe para Covid. Tem 7 criancinhas pequenas. Elas estão passando por um momento difícil, com fome. Vivem de doação. O senhor poderia ir lá fazer uma visita? Bebezinha de 6 meses sem fralda.”

Girleno diz que quer atender a todos os necessitados. “A gente precisa fazer algo neste momento tão difícil. E isto não é assistencialismo, é ajuda. As pessoas estão abandonadas. Não posso perder meus futuros alunos.”

No Pantanal, escola usa barco para atender crianças de comunidades ribeirinhas

Professores do Acaia Pantanal fazem visitas educativas durante a pandemia

Divulgação

“Ver uma escola no Pantanal foi um milagre. As gerações anteriores são de analfabetos. Não tenho nem palavras para explicar: é a educação mudando este lugar”, diz o fazendeiro Ruivaldo de Andrade, pai de Débora, de 8 anos.

Ela é aluna de uma escola rural de Corumbá, em Mato Grosso do Sul, quase na fronteira do Brasil com a Bolívia. É uma espécie de internato, criado em 2018 pelo projeto Acaia Pantanal.

Toda segunda-feira, um barco atravessa o Rio Taquari e busca as crianças das comunidades ribeirinhas. Apenas no sábado, depois de uma semana estudando, o grupo volta para casa.

Antes da abertura da escola, crianças e jovens da região basicamente não tinham acesso à educação - costumavam virar catadores de isca para a pesca de turismo.

“Era uma população que estava à deriva”, diz Sylvia Bourroul, diretora do projeto. “Compramos uma pousada que estava fechada e construímos um colégio de educação infantil e ensino fundamental I.”

Aulas do Acaia Pantanal chegaram a ser retomadas quando número de casos de Covid-19 estava mais baixo

Divulgação

Fornecendo transporte, alimentação e todo o material escolar, o Acaia Pantanal alfabetiza e forma os alunos até o quinto ano. Depois, eles costumam ir para a Fundação Bradesco, parceira do projeto em Miranda, a 3 horas de Corumbá.

“Nossa ideia é abrir mais portas para que os jovens façam suas escolhas. Se quiserem ser pescadores, não tem problema. Mas podem querer também virar veterinários, médicos, presidentes”, diz Sylvia.

Na pandemia, o ensino passou a ser remoto. Mas como chegar a famílias que não têm televisão, computador ou celular? Seu Ruivaldo explica: os professores vão à casa dos alunos. Chegam de barco, explicam as atividades e deixam os materiais.

“O colégio está reescrevendo nossa história”, diz.

Projeto de creche para crianças em vulnerabilidade doa cestas básicas

Enquanto a creche está de portas fechadas, David Pietro recebe atividades em casa

Arquivo pessoal

Em Colombo, na região metropolitana de Curitiba, mais de 300 crianças em situação de vulnerabilidade social podem estudar em período integral, gratuitamente, em creches e escolas de educação infantil do projeto Irmandade Betânia.

Em março de 2019, com a pandemia, os organizadores do projeto ficaram preocupados: os alunos, que passavam o dia inteiro na escola, ficariam 24 horas em casa.

“Bateu um desespero. Buscamos as famílias que passavam mais necessidade e doamos cestas básicas, em parceria com outras instituições. Nosso foco era apoiar principalmente os desempregados”, diz Denise Lau, diretora de duas escolas da Irmandade Betânia.

Na parte pedagógica, o projeto estabeleceu uma comunicação constante com os responsáveis pelas crianças. Foram enviadas atividades e orientações por whatsapp.

“Nossa preocupação era que os estudantes não perdessem o gosto pela escola. Montamos um sistema drive-thru, para os alunos verem, à distância, seus professores”, conta.

Herica Marques, mãe de David Pietro, de 4 anos, conta que este apoio foi fundamental. Ela e o marido trabalham como sacoleiros - e, na pandemia, passaram a vender bem menos roupas. “A escola me procurava para saber como a gente estava, do que precisava”, diz.

A cada 15 dias, ela vai ao colégio para pegar canudos, palitinhos, papéis e pastas com atividades.

“Eu não tenho jeito para ensinar. Mas a coordenadora liga e me explica como é para fazer. Fico muito grata”, afirma Herica.

Adolescentes do sertão nordestino ganham instrumentos musicais para treinar em casa

Projeto Novo Sertão organiza atividades pedagógicas para crianças e jovens de Betânia do Piauí

Divulgação

O projeto Novo Sertão atua no município de Betânia do Piauí, no interior do Estado. Há quatro anos, os alunos que têm boas notas na escola ganham a oportunidade de participar de aulas de esporte gratuitas.

Há, ainda, iniciativas na música: 30 crianças tocam instrumentos de sopro e de percussão na primeira banda sinfônica da região.

“Também formamos uma companhia de dança contemporânea, para que as crianças e jovens lidem com o corpo de outra forma. Aqui, a sexualidade começa muito cedo”, conta José Brito, diretor do projeto.

Na pandemia, os adolescentes puderam levar os instrumentos para casa.

“Muitos estavam em depressão. Mas a arte está abrindo os olhos deles para outras oportunidades. Antes, só conheciam a enxada”, afirma.

Crianças refugiadas recebem reforço on-line de língua portuguesa

A filha mais nova de Cristiano, refugiada no Brasil, tem aulas de reforço de português

Arquivo pessoal

Há cinco anos, o colombiano Cristiano Botero chegou ao Brasil com a esposa e as duas filhas do casal. Ele havia sofrido ameaças e sido sequestrado pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

“Estamos refugiados por causa da falta de segurança no nosso país. Eu tinha uma empresa, uma casa. Deixei tudo para trás”, diz.

Uma das principais preocupações de Cristiano era garantir a aprendizagem das crianças. A primogênita Valentina, hoje com 10 anos, teve dificuldade em entender a língua portuguesa na escola pública onde ainda estuda, em São Caetano do Sul (SP).

Quem indicou a solução foi o Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Aknur): a equipe encaminhou a menina ao projeto “IKMR - Eu conheço meus direitos”, uma organização sem fins lucrativos que presta apoio a crianças refugiadas.

Desde então, Valentina tem aulas semanais de português, com professores voluntários.

“Foi difícil para ela, porque o espanhol é sua língua nativa. Foram muitos problemas de linguagem. Mas as aulas de reforço abriram as portas para o crescimento dela”, diz o pai da criança.

Durante a pandemia, as atividades não foram interrompidas - o ensino passou a ser on-line.

“As aulas são muito legais. Eu leio, escrevo um monte de texto. Quando não entendo as coisas, pergunto”, conta a menina.

Projeto investe em alunos do 9º ano e os acompanha até o primeiro emprego

Suanny ganhou uma bolsa de estudos em um colégio privado de São Paulo

Arquivo pessoal

Em São Paulo, o Instituto Sol presta apoio a jovens do nono ano do ensino fundamental II. Os alunos da rede pública selecionados pelo projeto participam de um programa de reforço e fazem um teste de seleção para colégios privados e escolas técnicas. Se forem aprovados, podem cursar o ensino médio como bolsistas.

A ideia é acompanhar os jovens na última etapa escolar, na escolha da profissão, no preparo para a universidade e no primeiro emprego.

“A gente proporciona alimentação, transporte, uniforme, material didático, curso de idiomas e apoio psicológico”, conta Camila Du Plessis, diretora do instituto.

“Atualmente, são 39 jovens no projeto, mas queremos que sejam 100. É um atendimento muito intenso, por isso, é difícil aumentar o número de apoiados.”

Um deles é Suanny Araújo, de 17 anos, ex-aluna da rede estadual de São Paulo. Ela foi selecionada como “jovem sol” e ganhou uma bolsa de estudos no Colégio Santa Cruz, na capital.

“O apoio que o projeto me dá é surreal. Ainda tenho contato com meus amigos da antiga escola, então acompanhei o que foi a escola pública na pandemia. É uma situação muito preocupante”, conta.

“Vejo que estou em uma posição de privilégio. Sempre sonhei em crescer na vida, e o instituto está me ajudando nisto.”

Suanny conta que, diante das dificuldades trazidas pela Covid-19, pôde contar com o Instituto Sol. “Foi além das minhas expectativas. Doaram cestas básicas, me ajudaram até com uma cadeira mais confortável para estudar em casa. É uma relação de família”, diz.

Cursinho popular doa tablets e chips de internet para alunos acessarem aulas on-line

Nicoli será a primeira da família a estudar no ensino superior

Arquivo pessoal

Nicoli Ferreira, de 17 anos, queria ser a primeira da família a entrar na universidade. “Meu pai é pedreiro, minha mãe é dona de casa. Eles não terminaram a escola”, conta. “Eu queria tirar a defasagem do ensino público e me preparar.”

Ela conseguiu ser aprovada no cursinho popular da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), onde são oferecidas aulas gratuitas.

“Na pandemia, foi difícil, porque o ensino remoto é muito diferente. Mas o pessoal do cursinho disponibilizou tablets, computadores e chips de internet para todo mundo que não tinha como acompanhar as aulas on-line”, conta.

Nicoli já foi aprovada na FGV, como bolsista, e aguarda o resultado de outros vestibulares.

“O cursinho popular é uma baita oportunidade de mudar a vida do aluno e da família.”

Vídeo

Abaixo, assista a um vídeo sobre a queda de doações a projetos sociais durante a pandemia:

Doações diminuem em projetos sociais

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