Jovens e adolescentes falam de livros em vídeos descontraídos. Vendas de literatura infantojuvenil subiram 42% neste ano com 'Mentirosos', 'Vermelho, branco e sangue azul' e mais. VÍDEO: Livros indicados no TikTok entram em listas de mais vendidos no Brasil
Se os booktubers eram os novos críticos literários de 2018, os booktokers mandam em 2021. Vídeos longos para o YouTube se transformaram em curtas de 30 segundos para o TikTok.
A maioria dos booktokers é de jovens e adolescentes. Eles fazem resumos divertidos e criativos das obras, encenam personagens e pequenas análises. Também existem as listas temáticas, receitas inspiradas em livros famosos e, claro, memes e "trends".
A nova onda colocou quatro obras infantojuvenis antigas entre as mais vendidas do Brasil.
"Mentirosos" (2014), de E. Lockhart
"Um de nós está mentindo" (2017), de Karen McManus
"Corte de espinhos e rosas" (2018), de Sarah J. Maas
"Vermelho, branco e sangue azul" (2019), de Casey McQuiston
Essas obras ajudam a puxar uma alta de 42% nas vendas de obras para crianças e adolescentes no Brasil neste ano.
Além destes, outros que ganharam destaque no aplicativo também conquistaram boas posições nas listas de editoras, livrarias e comércio eletrônico ao longo do ano: O box "O povo do ar" (2018), de Holly Black; "Teto para dois" (2019), de Beth O"Leary; e "Os sete maridos de Evelyn Hugo" (2019), de Taylor Jenkins Reid.
Livros mais famosos no TikTok: 'Um de nós está mentindo', 'Mentirosos', 'Os sete maridos de Evelyn Hugo', 'O Príncipe cruel', 'Vermelho, branco e sangue azul' e 'Corte de espinhos e rosas'
Divulgação
Choro, romance e beleza
Estes livros se encaixam em pelo menos uma dessas características abaixo, sagradas para ganhar o coração e a estante dos leitores:
São obras de fantasia, suspense ou young adult;
Têm personagens LGBTQIA+ ou pertencentes a minorias;
Têm "plot twists chocantes", as viradas de roteiro;
Ser visualmente bonito, com capas e lombadas coloridas de preferência.
A boktoker e analista de projetos especiais do PublishNews Maju Alves estuda o fenômeno desde 2020 e diz que o segredo do sucesso é uma mistura de formato e coração.
Maju Alves é booktoker com 26mil seguidores
Reprodução/TikTok/Maju Alves
"São livros que causam emoções diversas nos leitores. Livros que fazem chorar, por exemplo, são enormes lá! (Como é o caso de 'Mentirosos' e 'Os sete maridos de Evelyn Hugo'). Romances e fantasia também são muito populares entre os leitores, ainda mais se tiver representatividade."
A representatividade não está só nos livros com personagens LGBTQIA+. Tiktokers, seja usuários ou produtores de conteúdo, têm procurado conhecer autores iniciantes e independentes. Uma parte deles também dedica espaço a autores nacionais.
"Os booktokers estão bem empenhados em indicar nacionais e livros com diversidade. Muitos autores estão no TikTok e acaba que criamos um carinho por eles. Também queremos elevar a literatura jovem nacional que não é muito valorizada. E sobre representatividade, [faz sucesso] porque as pessoas querem se enxergar naquilo que estão lendo", explica Myreia Liduario, com 22 mil seguidores e um perfil dedicado à literatura de fantasia.
Myreia Liduario é booktoker e tem mais de 22 mil seguidores em perfil dedicado à literatura de fantasia.
Reprodução/TikTok/Myreia Liduario
Neste gênero, se destacam as sagas protagonizadas por mulheres "que lutam e salvam o mundo". A cara da geração Z.
Com isso, escritores precisaram se tornar tiktokers. É o caso do potiguar Pedro Rhuas, vencedor do prêmio Flipop de 2020 com seu livro de estreia, "Enquanto eu não te encontro". Para promover o lançamento oficial da sua comédia romântica gay, ele criou um perfil que divulga não só sua obra, mas faz muito do que os booktokers fazem: listas, recomendações, artes para fãs e dicas de escrita.
O fenômeno da literatura young adult está ligado à faixa etária dos usuários da rede. "O TikTok não dá informação sobre a faixa etária de quem está consumindo conteúdo na plataforma, mas é possível ver, pelas interações com os seguidores, que tem um público novo, a partir de 12/14 anos. Já os criados de conteúdo são um pouco mais velhos, a maioria entre 18 a 25 anos", diz Maju.
Grande parte do público dos booktokers começou a ler recentemente, diz Myreia. Por isso, vídeos de unboxing e indicações de novos livros são o que mais bomba.
Aos negócios
O aumento das vendas já mostra seu impacto no mercado. O 6º Painel de Varejo do livro, feito pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros e a empresa Nielsen, mostrou que, neste ano, foram vendidos mais de 5 milhões de livros infantojuvenis/educacionais no primeiro semestre - um aumento de 42% em relação ao mesmo período do ano passado. É claro que há outros fatores, como a presença das crianças em casa.
O fenômeno é global. Nos Estados Unidos, desde 2020, livros com as mesmas características chegaram às listas de best sellers: o romance LGBTQIA+ young adult "Os dois morrem no final" (2017), de Adam Silvera; o romance épico homoafetivo sobre a Guerra de Tróia "A canção de Aquiles" (2011), de Madeline Miler; além de todos estes que também fazem sucesso no Brasil.
Uma das lojas da livraria Barnes & Noble, na Flórida, tem espaço dedicado aos livros que trendam no TikTok
Reprodução/Facebook/Barnes & Noble
Editoras e livrarias norte-americanas já estão tirando proveito desta onda. A tradicional livraria Barnes and Noble tem espaços nas lojas físicas e virtuais dedicados ao TikTok. Além disso, editoras têm parcerias sólidas com os nomes mais famosos da rede.
No Brasil, a propaganda ainda depende muito de "publis", quando editora ou autor pagam por vídeos dedicados ao seu catálogo. Maju Alves tem mais de 25 mil seguidores e cobra cerca de R$ 150 por vídeo. O valor depende do alcance e do formato da ação. Também existem as parcerias fixas com editoras. Com elas, os tiktokers não ganham dinheiro, mas recebem livros novos todo mês.