Cientistas brasileiros estão entre os encarregados de uma missão espacial para estudar anomalias que bloqueiam sinais de satélite. Com o lançamento do Sport no final deste mês, será possível entender, com maior precisão, como essas ocorrências afetam a infraestrutura de comunicação.
Sigla para Tarefa de Pesquisa, Observação e Previsão de Cintilação, o Sport resultou da colaboração entre as Agências Espaciais do Brasil e dos EUA com servidores do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Em 2014, os parceiros da missão se encontraram no Inpe para discutir o desenvolvimento de um satélite tecnológico para monitorar o clima espacial. Enquanto o ITA ficou responsável por desenvolver o produto, foi atribuída à Nasa a construção de cinco instrumentos para analisar dados como velocidade de íons e fluxo de elétrons no espaço.
Os servidores do Inpe fizeram os testes do satélite. Com o início da missão, vão operar o Sport, receber os dados dos instrumentos embarcados e distribuí-los entre os pesquisadores da parceria.
Em conjunto, os cientistas decidiram que o projeto deveria pesquisar bolhas de plasma, fenômeno de gases que perdem elétrons na ionosfera -camada da atmosfera entre 60 km e 1.000 km de altitude. O INPE estuda o tema desde 1970.
As bolhas começam pequenas após o pôr do sol e crescem de forma rápida, explicou Joaquim Costa, chefe da divisão de clima espacial do Inpe e gerente do Sport. Quanto mais crescem, continua o pesquisador, maior a probabilidade de bloquear ou distorcer a comunicação de satélites com a Terra.
Segundo Costa, o Brasil tem empresas, como mineradoras e transportadoras, que dependem do Sistema Global de Navegação por Satélite (GNSS). A falta da precisão nesse sinal, causada pelas bolhas, pode tanto provocar acidentes quanto prejuízos financeiros.
O Inpe já coordena um sistema para esse tipo de análise, o Embrace (Estudos e Monitoramento Brasileiro do Clima Espacial). O Sport, porém, deve melhorar as previsões e aumentar a compreensão da natureza das irregularidades.
"O Embrace tem uma rede de receptores GNSS com mais de 500 receptores sobre a América Latina, que são utilizados nessa vigilância", afirmou Costa. As redes do Embrace devem complementar o Sport.
"Conseguimos prever, mas não evitar a falha de comunicação", disse. "O que podemos fazer é mitigar; por exemplo, sugerir outro horário ou meios alternativos que não sejam afetados pelo distúrbio."
Mesmo que já existam satélites no espaço para medir as bolhas de plasma, o Sport tem inovações, afirmou James Spann, chefe da divisão de Clima Espacial da Nasa e um dos coordenadores da missão.
"As iniciativas de hoje têm trajetórias elípticas, um tipo de voo cuja altitude muda em relação à Terra. Já o novo minissatélite navega em uma órbita circular e, por isso, mantém a mesma distância do planeta", disse Spann.
O minissatélite ainda tem uma inclinação de 58º graus, que facilita o monitoramento de outras zonas do continente, localizadas antes e depois da linha do Equador.
Segundo o pesquisador da Nasa, a missão foi uma oportunidade de estreitar o relacionamento entre os dois países na área espacial. A parceria com o Inpe e o ITA foi facilitada pelo caráter público das instituições, disse.
Ter servidores dedicados a essa área é crítico porque ela exige esforço, tempo e confiança, continuou Spann. Devido à complexidade, o projeto demandou cerca de 70 pessoas entre professores, estudantes, engenheiros e outros profissionais.
"Fizemos coisas que nunca foram feitas em um satélite pequeno", disse. "A parceria correu bem porque o time era muito bom nos dois países. Todo mundo entrou no projeto com a vontade de obter sucesso."
O Sport, que foi levado à Estação Espacial Internacional no dia 26 de novembro, ainda não voa na sua órbita no espaço. Guardado na estação, o satélite deve ser lançado no final deste mês, quando entra na fase de comissionamento, que testa a operação da tecnologia.
Quando houver a liberação do satélite, o Inpe vai acionar a antena e os painéis solares para iniciar as medidas. O coordenador de clima da Nasa espera que a missão dure dois anos, antes de cair e queimar na atmosfera. "Se conseguirmos medidas por seis meses, vamos declarar sucesso", concluiu o pesquisador americano.
A Agência Espacial Brasileira (AEB) mediou as relações entre os parceiros do projeto e financiou parte do desenvolvimento. De acordo com Rodrigo Leonardi, coordenador do programa de satélites e aplicações da AEB, o Brasil mostrou competência na área espacial ao fazer um satélite em miniatura com qualidade.
"Além de estudar os fenômenos na ionosfera, estamos melhorando a expertise brasileira na engenharia e desenvolvimento de sistemas espaciais, que é importante para outras missões no futuro", disse.
(Matheus Ferreira / Folhapress)
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