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Educação

Abstenção no Enem de formandos da rede pública de SP é três vezes maior do que a de escolas particulares em qualquer raça


Desigualdade entre taxa de estudantes que não fizeram todas as provas no estado de São Paulo ficou ainda mais profunda por causa da pandemia. Pedidos de isenção da taxa do Enem 2023 podem ser feitos até as 23h59 desta sexta-feira (28). A desigualdade social e racial de acesso ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) aumentou durante a pandemia no Estado de São Paulo. Em 2021, estudantes do terceiro ano do ensino médio de escolas públicas, mesmo tendo direito a fazer a prova de graça, tiveram uma taxa de abstenção pelo menos três vezes mais alta que os formandos da rede privada em todos os recortes raciais.

Entre os candidatos pretos, pardos e indígenas, a taxa chega a ser cinco vezes mais alta na rede pública do que na particular. O levantamento foi feito pela TV Globo a partir de dados mais recentes divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), referentes à edição 2021 do exame.

A edição 2023 será aplicada em 5 e 12 de novembro, e o Inep recebe até as 23h59 desta sexta-feira (28) os pedidos de isenção da cobrança de taxa. O valor da inscrição ainda não foi divulgado. Em 2022, ele foi de R$ 85.

ENEM 2022 EM RIBEIRÃO PRETO - Caderno de prova de candidato após cinco horas de exercícios neste domingo (13)

Érico Andrade/g1

Impacto da pandemia

A edição 2020 do Enem foi a mais afetada pela Covid-19, inclusive com o adiamento do exame para janeiro, que acabou coincidindo com a onda de contágio da variante ômicron do novo coronavírus. Mas, mesmo em 2021, a pandemia ainda provocou uma abstenção mais alta que a da edição 2019 em todas as redes de ensino e raças.

Na edição 2019 do exame, só 4,3% dos estudantes brancos no terceiro ano do ensino médio de escola privada deixaram de fazer todas as provas. Na rede pública, a taxa de faltosos da mesma raça foi de 14,7%, uma diferença de 10,4 pontos percentuais.

Em 2021, as taxas subiram nos dois grupos: na rede privada, foi para 6% e, na pública, para 18,9%. Com isso, a diferença aumentou para 12,9 pontos percentuais.

Entre os formandos que, na inscrição do Enem, declararam ser da raça amarela, a abstenção na rede privada subiu de 2,8% para 3,5%. Na pública, a taxa aumentou de 16,5% para 18,6%. A diferença, que era de 13,7, avançou para 15,1 pontos percentuais.

O grupo de estudantes pretos pardos e indígenas matriculados em escola pública já tinha a taxa de abstenção mais alta no Enem 2019 (17,8%), e ela ficou ainda maior dois anos depois, chegando a 23,6%. Isso quer dizer que quase um em cada quatro alunos paulistas prestes a concluir o ensino médio e autodeclarados pretos, pardos ou indígenas se inscreveu para o Enem 2021, mas não conseguiu fazer todas as provas.

Na rede privada, o mesmo grupo racial registrou taxa de abstenção bem mais baixa, de 3,9% em 2019 e 4,5% em 2021. A diferença entre a rede pública e a privada foi a que mais cresceu, de 13,9 para 19,1 pontos percentuais (compare no gráfico abaixo).

Desempenho desigual

O levantamento também olhou para os formandos do ensino médio que conseguiram participar de todas as cinco provas do Enem 2021 em São Paulo. Os dados mostram que em todas elas a nota média de estudantes da rede privada foram mais altas que entre quem fez o ensino médio na rede pública.

A desigualdade no desempenho foi menor nas provas de linguagens e ciências humanas, mas aumenta nas provas de ciências da natureza e matemática. E a prova de redação foi a que teve maior discrepância entre os candidatos da rede pública e privada: a nota média de quem estuda em escola com mensalidade foi 18% mais alta:

Embora as universidades públicas federais sejam obrigadas por lei a garantir cotas para que estudantes de escola pública disputem várias entre si, e muitas instituições públicas estaduais e municipais também mantenham reserva de vagas, dados divulgados recentemente pelo Inep mostram que, entre 2010 e 2020, mais de um terço (34,2%) dos estudantes que conseguiram uma vaga em cursos presenciais de faculdades privadas, e um em cada cinco (19,2%) nos cursos EAD das privadas, usaram a nota do Enem para serem aprovados.

Ajuda aos formandos

No ano passado, depois e já terem passado pelo vestibular, um grupo de estudantes de graduação da Universidade de São Paulo (USP) decidiu ajudar estudantes da rede pública a superar o mesmo desafio.

Dentro de um projeto social no campus da Cidade Universitária, na Zona Oeste da capital, eles começaram a arrecadar material didático para distribuir a quem precisava deles para se preparar. Nasceu assim o Desapega Educação.

"A ideia surgiu dentro de uma disciplina da arquitetura", conta a estudante Beatriz Trombini. "A gente tinha que desenvolver uma plataforma, e começou a enxergar na USP uma demanda muito alta por material didático. A gente queria entender se existia uma demanda para receber materiais. A gente foi atrás de cursinhos populares a princípio, e conseguiu ver que as pessoas não tinham material didático e gostariam de ter", explicou ela.

Depois, o grupo percebeu que as necessidades de muitos estudantes vai além.

"Daí nasceu da ideia de fazer um caminho mais fácil entre as pessoas que queriam passar pra frente o material e as que queriam receber." (Beatriz Trombini, estudante de arquitetura a USP)

Em 2022, os estudantes desenvolveram um projeto de mentoria e, neste mês, selecionaram um primeiro grupo de seis alunas da rede pública paulista para participar.

"Além do material didático, os alunos têm outras demandas, então a gente entrega material didático e ensina como usar. Temos reuniões com todas juntas e separadamente com todas elas. A gente tem a parte de oportunidades, de mostrar como se inscrever pra conseguir a taxa de isenção. E tem a mentoria, entre o tutor e a aluna, começa a tratar focos específicos em que a aluna tem dificuldade. Por exemplo, uma delas tem dificuldade de se organizar e fazer um calendário de estudos, a gente vai trabalhando caso a caso."

A estudante Nicolly Vidal, que atualmente está matriculada no segundo ano do ensino médio, foi uma das selecionadas na primeira edição do Desapega. "Eu tenho muita dificuldade no meu cronograma. Me ajudaram com as provas, isenções de taxa", disse ela. "Me sinto cada vez mais segura, porque antes eu me sentia desamparada. E eles estão ajudando muito com isso."

G1

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