No Brasil de dimensões continentais, as palavras “pais” e “paz”, dependendo do sotaque, têm o mesmo som. E a elas ainda poderia se juntar outra: “país” – com o sinal diferencial para acentuar a força cultural de seus 203 milhões de habitantes. Neste domingo especial, o Estado de Minas presta uma homenagem, reunindo pais que têm a paz como missão, trabalho, crença, e, com sua experiência, ajudam a construir a nação onde vivem 51,2 milhões de homens que têm filhos – na Região Sudeste, são 21,7 milhões de pais (acima de 15 anos), de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde (2019) do IBGE. Sem contar os outros tantos que, ainda que sem laços sanguíneos ou legais, têm a paternidade no coração.
Carregar esse sentimento significa estar de olho na paz, em qualquer idioma, terra, momento. “Defender a paz exige mais coragem do que promover a guerra”, diz, com conhecimento de causa, o capitão do Exército Carlos Henrique Pereira, de 69 anos, nascido e residente em Sete Lagoas, na Região Central de Minas, a 70 quilômetros de Belo Horizonte.
Pai de Mariane Almeida Pereira Figueiredo, fonoaudióloga e estudante de medicina, e avô de Henrique, de 2 anos, o capitão, hoje na reserva do Exército Brasileiro, integrou a missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) em Angola, em 1996, no período da guerra civil que devastou o país africano. “Vimos a situação de miséria das pessoas. Pensava na minha família, e só aumentava a saudade da minha filha, a exemplo de tantos pais brasileiros que estavam lá”, lembra o militar, que passou seis meses longe de casa.
Passados quase 30 anos, o capitão explica que, na busca da paz para se evitar uma guerra, é preciso esquecer todas as questões pessoais e se concentrar apenas no coletivo. “Como militar, estava preparado para servir em um país destruído pelos conflitos, mas, a cada instante, fortalecia o pensamento que o mais importante era a coletividade.”
Concerto para celebrar a uniãoEm Belo Horizonte, o juiz de paz Leonardo Miguel de Oliveira vê a esperança e a harmonia como fundamentais ao mundo. E a confiança aumenta ao lado do filho Victor Miguel de Mattos Amaro Lima, de 23, biólogo. Além de advogado, Leonardo é músico, e, diante do teclado do piano, conta que compôs “Victoriosos” para o jovem que está se preparando também para estudar medicina.
Leonardo Miguel, de 58, atuou, a partir de 1989, como especialista no Direito das Famílias, “conhecendo bem as facetas e as agruras desse ofício”, e, há nove anos, foi nomeado juiz de paz pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), passando a celebrar casamentos civis. “Por quase 25 anos separei/divorciei casais, agora, estou unindo as pessoas”, destaca.
Em uma comparação entre os dois trabalhos, Leonardo considera o atual mais prazeroso. “Sou movido pela esperança. No exercício da advocacia, presenciei situações muito difíceis, discussões ásperas e muito sofrimento dos envolvidos no curso dos processos, principalmente dos menores. Como advogado, por estar equidistante do litígio, pude enxergar com melhor clareza o que o casal, no momento, não conseguia ver. Sempre busquei o consenso entre as partes antes de ajuizar qualquer ação”, observa.
Em suas celebrações civis como juiz de paz, ele faz questão de incluir a solenidade da troca de alianças, por ser um elemento simbólico da união. Celebrante ecumênico, realizando casamentos ao ar livre, em sítios e casas de campo ou em salões de festas, ele proclama: “Fico feliz ao unir as pessoas”.
Cantor, pianista, compositor e atualmente integrante de uma banda de BH, o advogado não se preocupa somente com a harmonia musical, mas com todos os sentidos que envolvem a palavra. “Fico triste ao perceber que a humanidade está em uma escalada de ódio. E me assusta muito essa beligerância. As guerras continuam, mas serei sempre a favor da paz. O meu espírito é pacificador”, afirma. Com essa inspiração, e com abraços e coração aberto, o dia promete ser de esperança no futuro, qualidade indispensável a qualquer pai.
Uma aposta na força da família
Ter os olhos na paz implica manter todos os sentidos elevados na direção da harmonia mundial. Afinal, “quem semeia a paz vive em paz”, reflete o acupunturista Humberto Mattarelli Carli, casado há 40 anos com Lúcia de Almeida Carli, pai de Bernardo, de 35, e Lorena, de 33, ambos fisioterapeutas. Na residência da família em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, o dia hoje é de festa e de união em prol do planeta. “A paz no mundo depende das famílias, pois tudo começa no lar”, afirma o profissional, formado, na década de 1980, na Faculdade de Medicina Tradicional Chinesa, em Pequim.
Em busca de práticas positivas no dia a dia, envolvendo tanto a saúde quanto preocupações ambientais, Humberto Mattarelli coordena também o Terço da Paz, na Catedral Cristo Rei, em construção no Bairro Juliana, na Região Norte de Belo Horizonte. Todos os sábados, às 15h, homens e mulheres se reúnem para agradecer, pedir graças, enfim, unir forças. “Um dos objetivos é fazer o resgate das famílias, pois muitos sofrem e às vezes não sabem como agir”, afirma.
Desde julho de 2016, quando o grupo começou a se reunir por orientação do arcebispo metropolitano de BH, dom Walmor Oliveira de Azevedo, foram registrados vários relatos memoráveis de participantes. “A oração tem o poder de transformar as pessoas. Como dizia a beata mineira Nhá Chica, de quem sou devoto: ‘Tudo acontece porque vivo com fé’.”
Considerando-se agraciado por coordenar o Terço da Paz, Humberto destaca integrantes do grupo que conseguiram pôr fim a jornadas dolorosas, como a violência em casa, especialmente contra mulheres, e infernos domésticos causados pelo uso de drogas e alcoolismo, além de perdas familiares e das doenças curadas com apoio da fé. “Muita gente desempregada, ao recuperar o equilíbrio interior, teve condições de voltar ao mercado de trabalho”, ressalta o coordenador.
Em Sabará, Humberto participa também do Terço dos Homens, que agrega cerca de 1,1 mil casados e solteiros, toda terça-feira, às 20h, na Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, no Centro Histórico. “Acredito piamente em dias melhores para a humanidade. Neste Dia dos Pais, repito que as famílias deve cultivar os valores que Jesus quer de nós: caridade e boa conduta. Só assim teremos um caminho seguro.”
Esforço por uma conquista diária
Integrante há seis anos do Terço da Paz, o diácono permanente João Francisco de Oliveira, morador de Vespasiano (Grande BH), não tem dúvida de que a paz é uma conquista diária, com pilares essenciais ao mundo. A base está na dignidade humana, afirma. “Precisamos de justiça social, comida na mesa, trabalho, habitação, e de forma especial, educação”, afirma João Francisco.
Casado há 47 anos com Maria de Lourdes Oliveira e pai de Arminda e João Francisco, o diácono ligado à Arquidiocese de BH acredita que só existe futuro, inclusive para a paz, com educação. E põe fé: “Em qualquer tempo, ainda mais quando há dificuldades e privações, devemos ter o coração aberto aos ensinamentos de Jesus e ao amor de Nossa Senhora. Está aí um caminho importante para a paz. Como está na Bíblia, ‘a paz é fruto da inspiração do espírito”.
Estado de Minas