A revitalização da Avenida Afonso Pena, principal eixo do Centro de Belo Horizonte, anunciada em agosto pela prefeitura da capital, esbarra na preservação do pa- trimônio histórico e da vegetação urbana. O projeto, que promete melhorias do transporte coletivo, das ciclovias e da acessibilidade na região, foi aprovado apenas parcialmente. Isso porque a iniciativa prevê alterações em trechos protegidos das praças Tiradentes, Benjamin Guimarães (mais conhecida como Praça ABC, no cruzamento com a Av. Getúlio Vargas) e Milton Campos. Reunião do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural, prevista para o dia 16, será decisiva para definir os rumos da proposta.Idealizado pela BHTrans, o projeto prevê a alteração da geometria dos quarteirões fechados e calçadas dos cruzamentos da Afonso Pena com as avenidas do Contorno, Getúlio Vargas e Brasil. As intervenções envolvem, especialmente, a remoção de árvores e criação de trechos de passagem de veículos e travessia de pedestres. A questão é que, para implantá-las, é necessária uma diminuição na área de praça desses quarteirões. A Diretoria de Patrimônio Cultural e Arquivo Público (DPCA), órgão responsável pela implementação e gestão da política de proteção aos bens culturais, chegou a solicitar uma revisão da proposta, porém a BHTrans insiste na manutenção do projeto original. No trecho da Praça Tiradentes, no cruzamento das avenidas Afonso Pena e Brasil, está prevista uma redução na curvatura das esquinas e retirada de árvores para a criação de uma pista para passagem de veículos. Já na Praça ABC, na esquina com a Av. Getúlio Vargas, está prevista a implantação de ilhas de travessia para facilitar o deslocamento de pedestres. No trecho, localizado no Bairro Funcionários, há dois imóveis tombados pelo patrimônio, onde se encontra a Padaria Bonomi e a Igreja Presbiteriana. Essas intervenções também devem exigir a retirada de árvores. Por fim, a Praça Milton Campos, no cruzamento da Afonso Pena com a Avenida do Contorno, tem previsão de recortes nos quarteirões para receber mais asfalto.
PASSAGEM EXCLUSIVAPARA O TRANSPORTE
Ao todo, serão 4,2 quilômetros de intervenções na Afonso Pena, partindo da Praça Rio Branco, mais conhecida co- mo Praça da Rodoviária, no Centro, até a Praça da Bandeira, no Bairro Serra, Região Centro-Sul. O projeto envolve intervenções paisagísticas e melhorias na travessia de pedestres, além de criação de ciclovias sobre o asfalto e sobre parte no canteiro central. A proposta também busca diminuir o tempo das viagens do transporte coletivo, por meio da implantação de faixas exclusivas, da alteração de sentido de algumas vias e da diminuição do tempo de espera em al- guns sinais.A Prefeitura de Belo Horizonte não detalha como seria a operação das faixas exclusivas para ônibus – com potencial de forte impacto para a circulação de veículos e pedestres –, sob o argumento de que o projeto ainda está em andamento. O custo estimado das obras é de cerca de R$ 20 milhões. A expectativa é de que o projeto seja iniciado ainda este ano, com prazo de execução de até 10 meses. A prefeitura já adiantou que a tradicional feira de artes e artesanato, montada todo domingo na Afonso Pena, será preservada. Preocupação com áreas simbólicas para a cidade Na avaliação da Diretoria de Patrimônio Cultural e Arquivo Público, as intervenções propostas nas praças, ainda que restritas, podem alterar a leitura dessas áreas de “respiro” na avenida. Segundo parecer do órgão, o espaço urbano apresenta grande relevância para a cidade, “tanto por seu valor histórico-urbanístico quanto por suas praças e por seus espaços edificados, que, ao longo do tempo, incorporaram-se ao imaginário coletivo e à configuração da cena urbana”.A diretoria ressalta, ainda, ter avaliado somente os impactos das intervenções nos conjuntos protegidos, e não se o projeto atende de forma eficaz aos objetivos a que se propõe. O Estado de Minas procurou a Prefeitura de Belo Horizonte para se posicionar sobre a questão, mas a administração informou que vai aguardar a discussão e a decisão do Conselho Deliberativo do Patrimônio, prevista para o dia 16.
COMPENSAÇÃO Para a arquiteta e urbanista Cláudia Pires, conselheira do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/Seção Minas Gerais), cabe ao conselho avaliar a pertinência da proposta e se há necessidade de medidas compensatórias para minimizar o impacto da redução das áreas das praças. “Tem que respeitar aquilo que não se pode mexer e compensar na redução dos espaços de uso público, sem prejuízo para a mobilidade, pois nem só de asfalto vive o homem”, avalia. Cláudia avalia positivamente o projeto de revitalização da Avenida Afonso Pena, mas cobra atuação mais efetiva da prefeitura também em áreas periféricas. “É preciso ver a relação de desigualdade de acesso a uma rua, a uma ciclovia nas periferias onde, inclusive, calçadas e ruas estão em péssimo estado. Essa deveria ser a discussão central”, afirma. Apesar do impasse inicial, a Diretoria de Patrimônio Cultural e Arquivo Público não apresenta grandes empecilhos para a aprovação do projeto. Mas, como contrapartida, defende a criação de áreas verdes no perímetro das praças, para compensar a redução da área ajardinada. Corte de árvores também deve ser previamente analisado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente. A prefeitura não detalha ainda o total de espécimes que será necessário retirar. Para garantir a aprovação do projeto, as intervenções em outros trechos, como as praças da Liberdade e Floriano Peixoto, que fazem parte do perímetro de proteção do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), também deverão ser submetidas à análise e aprovação do instituto.
CONDICIONANTES A revitalização da Afonso Pena, no entanto, já foi parcialmente aprovada pela Diretoria de patrimônio. No trecho entre a Rua da Bahia e a Avenida Carandaí, por exemplo, apesar da determinação de se preservarem as calçadas originais da cidade, foi autorizada a remoção do calçamento em pedra portuguesa para adequação das condições de acessibilidade.As pedras eventualmente removidas serão usadas na reintegração da calçada original em trechos que apresentem peças soltas ou buracos. A Diretoria de Patrimônio também impõe a relocação de bancas de revistas em frente a imóveis tombados ou com processo de tombamento aberto.